sexta-feira, 3 de julho de 2015

14º DOMINGO DO TEMPO COMUM - ANO B

05 de julho de 2015

Leituras

         Ezequiel 2,2-5
         Salmo 122/123,1-4
         2Coríntios 12,7-10
         Marcos 6,1-6


“APENAS CUROU ALGUNS DOENTES, IMPONDO-LHES AS MÃOS”


1- PONTO DE PARTIDA

Domingo do profeta Jesus na sinagoga de Nazaré. O domingo é nossa Páscoa semanal em que celebramos a festa da vida que vence a morte. Celebramos a fé naquele que se encarnou no seio de Maria, fez-se homem, sofreu, foi morto, sepultado e ressuscitou. Entramos em comunhão com Ele, assumindo nossa história humana com todos os riscos: indiferença e rejeição, injúrias, perseguições e angústias.

Hoje somos chamados a passar da morte para a vida, comprometendo-nos a agir com mais generosidade para realizar a vontade do Pai na terra, tão bem como no céu.

Celebramos a Páscoa de Jesus que experimentou a rejeição em sua própria terra, de seu próprio povo e, hoje, continua rejeitado na vida de tantas pessoas marginalizadas e excluídas da vida social, política e até de nossas comunidades.

Recebemos, ó Deus, a tua misericórdia no meio da tua casa. Teu louvor se estende, com o teu nome, até os confins da terra. Toda a justiça se encontra em tuas mãos (Salmo 48,10-11), antífona do canto de abertura de hoje.

2- REFLEXÃO BÍBLICA, EXEGÉTICA E LITÚRGICA

Primeira leitura – Ezequiel 2,2-5. “Que ouçam ou não, saberão que há um profeta entre eles”. A primeira leitura faz parte da longa narrativa da vocação de Ezequiel (capítulos de 1 a 3). Dominado pela magnífica visão da glória divina, o profeta estava prostrado por terra. Ma a voz de Deus lhe ordena que se ponha de pé para ouvir o encargo da missão (2,1). Ezequiel sente-se invadido e dominado pela força do Espírito de Deus (cf. 3,12.24; 8,3; 11,1), à medida dos juízes (Juízes 14,6.19; 15,14) ou dos antigos profetas, Elias (1Reis 18,12; 2Reis 2,16) e Eliseu (2Reis 2,15). Como os profetas que vieram antes de Ezequiel, ele tem consciência clara de ser um enviado de Deus.

Diante de um povo insensível, rebelde, “cabeça dura e coração de pedra (2,4), Ezequiel deverá se apresentar como encarregado de uma missão divina (“tu lhes dirás”) a ser autenticada com a fórmula “oráculo do Senhor Deus”.

Esta leitura nos mostra que Deus sempre envia profetas para nos chamar à conversão, mesmo quando não queremos escutá-los. A atividade de Ezequiel pode ser situada entre 593-571 a.C., período de dificuldades e sofrimentos para o povo de Deus exilado na Babilônia. Em ambiente difícil e hostil, ele precisa manter lucidez profética. Sua missão é dramática: está junto ao povo, mas não deve dizer palavras agradáveis. É chamado de “filho do homem”, o que significa que pertence à frágil raça humana. Ele nada mais é que um homem, um servo.

Ezequiel caído, prostrado como todo povo exilado, recebe o espírito de profecia que o põe de pé e lhe permite discernir em meio a situações difíceis e obscuras o que Deus fala. Gostando ou não, deve ser porta-voz de Deus no meio do povo. Profeta não é diplomata. Sua missão tem duplo sabor: experimenta a doçura do mel que brota da Palavra de Deus, mas esta mesma Palavra lhe causa a amargura. Deve proclamá-la, sendo aceita ou não, oportuna ou inoportunamente, mesmo rejeitado.

Ser profeta é por em risco a própria vida. Para ele não há previsão de elogios e aplausos. O exílio da Babilônia não foi fruto do acaso, como não o é a miséria, a dependência e a opressão em que vive o povo hoje. O sofrimento de muitos era responsabilidade da elite que também se encontrava na Babilônia: a “nação de rebeldes, filhos de cabeça dura e coração de pedra” (2,4). Ela se torna surda aos apelos que Deus faz por meio de Ezequiel. Mesmo sem ser ouvido, o profeta é um sinal de que Deus não abandona seu povo.

Ezequiel, a exemplo dos demais profetas, tem certeza de ser um enviado de Deus. Quando fala não o faz por interesse pessoal, mas por imperativo divino. Como outros profetas foi por isso rejeitado e incompreendido (Ezequiel 33,30-33; cf. Isaias 6,9s; 28,9-22; Jeremias 11,19-21), pois a pretensão de falar em nome de Deus é sempre vista com desconfiança por parte das pessoas. Teve que denunciar o pecado e anunciar o castigo (Ezequiel 4-24), e depois reanimar o povo abatido (Ezequiel 37), na certeza de que o Senhor estava com ele. Teve que lutar sozinho contra a correnteza da opinião pública, acostumada a ouvir as palavras agradáveis dos falsos profetas, anunciadores de uma segurança ilusória (Ezequiel 13). Só com o passar do tempo, quando os fatos históricos dessem razão (Ezequiel 24,25-27; 33,21-22) para Ezequiel, é que o povo “ficaria sabendo que houve um profeta entre eles” (2,5).

Como aconteceu com Ezequiel e outros profetas, haveria de acontecer com Jesus. Também Ele foi investido pelo Espírito no momento do seu batismo no Jordão para anunciar a Boa-Nova do Reino. Os primeiros a rejeitá-Lo foram seus próprios conterrâneos de Nazaré (cf. Marcos 6,1-6). Somente após a sua morte e ressurreição é que a figura de Jesus de Nazaré seria reabilitada.

Salmo responsorial 122/123,1-4. Este salmo data, sem dúvida, dos tempos que se seguiram à volta do Exílio da Babilônia ou da época de Neemias, quando a comunidade renascente era alvo do desprezo e dos ataques pagãos (cf. Neemias 2,19; 3,36). É uma súplica coletiva. É o povo todo (“os nosso olhos”, “de nós”) que clama (“compaixão de nós”, “estamos fartos”, “nossa vida”). Clamando a Deus, pedindo compaixão diante de algo que atingiu toda a comunidade.

O rosto de Deus no salmo 122/123. Deus aparece em dois momentos. É apresentado como Senhor do povo, mas um Senhor que, em lugar de dar ordens mudas, atende com respostas de compaixão, traduzida em liberdade e vida. Sua característica  mais importante neste Salmo é, de fato, a compaixão pelo povo, farto de miséria e desprezo dos grandes.

Lucas é o evangelista que gosta de apresentar Jesus e o Pai compadecendo-se (Lucas 7,13; 15,20). Se no Salmo o povo não reclama inocência, confessando a própria culpa com o olhar que pede compaixão, Jesus se apresenta como Aquele que conhece o que há dentro das pessoas e, por isso, perdoa pecados (Lucas 7,36-50; Marcos 2,5). Jesus atendeu a todos os clamores, de uma pessoa ou de várias. Não tratou os seus como servos, mas como amigos (João 15,14-15).

O Salmo 122/123 é expressão do povo cheio de sofrimento e de desprezo. Contudo, em vez de abaixar a cabeça e o olhar, está com os olhos fixos em Deus, até que dele se compadeça. É uma oração coletiva de pedido de socorro.

Cantando este salmo na liturgia desse Domingo, apresentemos ao Senhor o sofrimento de todos os oprimidos da América Latina e do mundo.

Segunda leitura – 2Coríntios 12,7-10. Talvez ninguém recebeu tantos dons extraordinários como Paulo. Em vez de revelar o seu mundo divino, detém-se em seu mundo humano e fraco. No versículo 5 ele distingue dentro dele dois homens: - o cristão que é divino e se apóia na união vital com Cristo, e – o humano, com suas debilidades. Afirma que poderia gabar-se das revelações divinas, mas prefere se engrandecer de suas fraquezas, que são coisas próprias (versículo 5-6). Além disso, declara algo importante: perante seus privilégios, para não cair na soberba, como contrapeso, foi-lhe posto um como espinho na carne. Segundo os exegetas, tal “espinho na carne” seria uma referência a uma enfermidade corporal que o fazia sofrer de modo exagerado, física e moralmente, impedindo-lhe o bom desempenho de sua missão apostólica; muito se escreveu e pouco se pode afirmar sobre a natureza dessa doença: febre? oftalmia? ataques de nervos? Parece tratar-se da mesma doença de Gálatas 4,13-14. Padres da Igreja, seguidos por modernos, julgam ver ai claramente as perseguições que Paulo passou.  Há quem sugere que o “espinho na carne” significa até as tentações da carne. Todas são posições justificáveis.

Para Paulo, somente a fraqueza exterior desvenda a natureza profunda de sua missão. Por isso, prefere ver a garantia desta última nos mensageiros de Satanás e no espinho da carne (versículos 7-9), que provavelmente também simboliza a inimizade dos falsos irmãos (sentido desta expressão está em Números 33,55; Josué 23,13; Ezequiel 28,24).

O verbo “esbofetear” significa humilhação, desprezo, visando prevenir da vaidade. Paulo pediu por bem três vezes ao Senhor – como Jesus no Getsêmani (cf. Mateus 26,44) – que lhe tirasse o vexame (versículo 8). Ele ora “ao Senhor”, a Jesus glorioso, cheio de poder sobre as potencias do mal (Mateus 12,29; Colossenses 2,15). Assim Paulo e a Igreja rezam a Cristo, coisa pacífica para nós hoje. Porém nem sempre foi assim: nos primórdios da cristandade, a oração era dirigida de preferência a Deus Pai, sem excluir Jesus Cristo, por isso que os cristãos são os que invocam o Nome do Senhor Jesus Cristo (Atos 9,14) e a Igreja é a comunidade dos que suplicam ao Nome de Nosso Senhor Jesus Cristo (1Coríntios 1,2).

Esta leitura mostra-nos o que ampara o discípulo de Jesus em sua missão. Paulo experimenta um “espinho na carne”; conflitos que quem segue Jesus encontra e enfrenta dentro e ao redor de si mesmo. Por dentro a pessoa se sente repleta de fraqueza e de necessidades. Por outro lado, já os conflitos que vem de fora: “fraquezas, injúrias, perseguições e angústias sofridas por amor de Cristo”.

“A você, basta a minha graça”. Nasce, assim, uma espiritualidade do conflito, uma mística que descobre Deus não no sucesso, mas justamente no aparente fracasso de pessoas e projetos, pois o próprio Deus se manifestou vitorioso no suposto fracasso de Jesus na cruz. É uma presença que é graça, força, dinamismo. “Quando sou fraco, então é que sou forte”, porque o que o amparo na missão é a graça de Deus.

Evangelho – Marcos 6,1-6. Na passagem de uma viagem missionária, Jesus passa por Nazaré, a cidade de sua família. Toma a palavra no dia de sábado na sinagoga, segundo as regras admitidas então para a homilia da segunda leitura (Lucas 4,16-30), mas só recebe desprezo e recusa.

Na época, a liturgia da sinagoga estava centrada em duas leituras. A primeira, tirada da lei (Pentateuco), era lida e comentada por um doutor da lei; a segunda, de origem mais tardia, devia ser tirada dos profetas e podia ser lida e comentada por qualquer pessoa que tivesse pelo menos trinta anos de idade. Ora, Jesus acaba de celebrar seu trigésimo aniversário e, por isso, reivindica o direito de ler e comentar a segunda leitura. Portanto, seu primeiro discurso público é uma homilia litúrgica (cf. Lucas 4,16-30).

Sua própria família recusa-lhe confiança que Ele reclama (versículo 4; cf. João 6,44, a referencia aos seus parentes é própria de Marco).

Os judeus indicam aqui Jesus com o termo de “filho de Maria” (versículo 3), modo de falar que faz referencia  a um nascimento ilegítimo. Maria teve que sofrer estes enganos (cf. o sentido a ser dado talvez a Lucas 2,35) e freqüentemente ausentou-se de Nazaré, precisamente no momento de sua gravidez (Lucas 1,56); Mateus 2,21-22). Ser Mãe do Messias não é apenas um privilégio: Maria aprende a carregar a injúria como Jesus aprende a carregar a cruz.

O evangelista apresenta uma teologia da missão da comunidade e da Igreja à qual ele pertence e para a qual ele escreve. A atividade missionária da década de sessenta e setenta depois de Cristo é revista e interpretada à luz da pregação e da sorte de Jesus. O evangelista mostra que Jesus continua presente na pregação do Evangelho em todos os tempos.

“Ficaram espantados”. Significa ferir, chocar, espantar e até ficar fora de si. Isto significa que a figura de Jesus e a doutrina dele questionam a assembléia e exigem uma tomada de posição. Pode ser uma posição a favor ou contra Ele, mas exclui-se uma atitude neutra.
Ora, a própria liberdade da fé supõe a ambigüidade da personalidade de Jesus. E esta ambigüidade não se separa pelo fato de que Ele é Deus e homem ao mesmo tempo. A sua humanidade esconde e ao mesmo tempo revela a sua divindade. Marcos em sua teologia quer dizer assim: quanto mais a divindade se esconde por trás da humanidade de Jesus tanto mais ela se revela.

O que o evangelista fez para o seu tempo e ambiente é tarefa contínua da Igreja: rever sua caminhada e sua missão à luz do Evangelho e da memória de Jesus. A religião cristã não consiste em construir e manter uma fachada que enfeita o nosso mundo com recintos sagrados e sinais religiosos e cristãos, nem em varias o ritmo da vida com certas celebrações esotéricas e manifestações públicas religiosas que deixam o próprio mundo, isto é, as pessoas e sua história sem serem atingidos com celebrações alienantes (cf. Mateus 7,21-23; Lucas 13,25-27; 6,46 e textos do Primeiro Testamento como Jeremias e contexto).

Na teologia que Marcos desenvolve entre 1,21-27 e 6,1-6 ele esmiúça bem claramente o que vem a ser a religião cristã. É entrar no processo histórico que Jesus inaugurou; é participar da sorte Dele e entrar no seu caminho, que é o do divino no humano, do sagrado no profano, do transcendente no imanente; em outras palavras é o caminho de encontrar o Reino de Deus na história e da “santificação” do mundo e das pessoas.

No início da missão na Galiléia, Jesus foi aceito com entusiasmo pela multidão que o ouvia e acolhia a Boa-Nova, principalmente entre os pobres e doentes. Mas ao mesmo tempo sofreu rejeição em sua terra natal, por parte de seus familiares e vizinhos. Seus conterrâneos esperavam um Messias forte e dominador e não podiam imaginá-lo simples carpinteiro e filho de Maria. É o símbolo da não aceitação de um povo que mata os profetas enviados por Deus.

Jesus vai a Nazaré e ensina na sinagoga. É uma visita marcada pela admiração. No início, quem se admira são os ouvintes. Porém, tal admiração não os leva à fé em Jesus, e sim à rejeição, pois vêem Nele “uma pedra de tropeço”. No final desse Evangelho, é Jesus quem se surpreende com a falta de fé do povo, o que impede a realização de milagres. Fora do contexto da fé, um milagre perde o sentido. O poder da fé não se limita a curas, mas à chegada e à manifestação do Reino de Deus.

O que é extraordinário em Jesus-Messias é o fato de em nada ser diferente da pessoa humana comum: é justamente sua encarnação. O Filho de Deus se fez como qualquer um de nós, inseriu-se na história de seu povo, onde aprendeu e cresceu em humanidade. “Pois ele mesmo foi provado em tudo como nós, com exceção do pecado” (Hebreus 4,15b)

3- DA PALAVRA CELEBRADA AO COTIDIANO DA VIDA

A Palavra de Deus, neste domingo, nos faz um apelo: não depositar a nossa confiança nos grandes. Também não precisamos ter medo de nossa pequenez e fraqueza. Na trajetória de Jesus, o maior fracasso se transforma em vitória e ressurreição. Junto a Ele há lugar para os fracos. Em Cristo somos fortes. Como nos diz Paulo na segunda leitura, podemos descobrir que a nossa força pode estar escondida em nossa própria fraqueza.
Jesus fica admirado com a falta de fé das pessoas de sua terra, as quais não acreditam que Deus possa falar através de pessoas simples. A Palavra de Deus se reveste de roupagem humana e vem a nós com o auxílio da história e de pessoas frágeis, enviadas por Ele. A fraqueza humana dos enviados por Deus cria um espaço de liberdade; quem ouve pode decidir a favor ou contra. Às vezes, gostaríamos que Deus se revelasse mediante atos maravilhosos e assim evitaríamos o trabalho de discernir quando e por meio de quem Deus se revela.

Jesus se fez servo e, por isso, entra em choque com os que preferem o privilégio e o poder. A encarnação continua nos questionado.

Jesus de Nazaré foi motivo de escândalo para os que O viram com os olhos humanos. A quem não quer crer, Ele nada revela, não faz milagre nenhum. Mas a nós, reunidos na fé, Ele se revela em toda a profundidade. A celebração é momento de assumir diante de Deus as nossas fraquezas, acreditando que só o que é assumido, pode ser transformado.

A missão profética se insere numa realidade de conflitos. Hoje as fraquezas e necessidades que batem à porta de quem se dedica ao trabalho pelo Reino de Deus são o medo, diferentes modelo de igreja, insegurança, despreparo, falta de recursos materiais e humanos. Como transformar a fraqueza, a ponto de ser nela que a força de Deus se mostra perfeita?

O documento de Puebla nos fala do “potencial evangelizador dos pobres”. O que podem nos dizer os pobres, os deficientes de nosso país? Aceitamos a revelação de Deus vinda na fraqueza de nossos irmãos e irmãs, na simplicidade do dia-a-dia?

4- A PALAVRA SE FAZ CELEBRAÇÃO

A escola de Nazaré

O anúncio de Jesus continua hoje na celebração, isto é, a Palavra se faz celebração. Ele nos reúne, apesar de nossa cabeça dura e nossas limitações, para acolher com fé a sua mensagem. Dirige-nos sua Palavra e nos ensina, ainda que estejamos pouco abertos para acolher a sua Palavra de vida. Coloca-nos ao redor de sua mesa, mesmo que nossos olhos ainda estejam um tanto obscurecidos para reconhecer sua presença ao partir o pão. Nos sinais do pão e do vinho encontramos a verdadeira metáfora da rejeição de Nazaré, narrada pelo Evangelho: como pode um alimento tão cotidiano, tão simples nos transportar à comunhão com a divindade do Filho de Deus? Como um fruto trivial, esmagado e dado como bebida, tantas vezes apreciado nas mesas por puro prazer, leva-nos a realizar a nova e eterna Aliança? Os sinais da fé que nos reúnem são igualmente desacreditáveis. E, de fato, para muitos o são... Mas a fé cristã, que só pode ser compreendida segundo a dinâmica sacramental da salvação, em que Deus se dá a conhecer ao modo humano (simples, simbólico, frágil), indica-nos esse caminho: “é pela humanidade que Ele nos salva” (Constituição Conciliar Sacrossanctum Concilium, sobre a Sagrada Liturgia nº 5. Sem olhar para Nazaré e para a escola que o pequeno vilarejo significou na vida de Jesus, não entenderemos o valor da sua humanidade para a nossa salvação. O saudoso Papa Paulo VI o compreendeu: “Nazaré é a escola onde se começa a compreender a vida de Jesus: a escola do Evangelho. Aqui se aprende a olhar, a escutar, a meditar e penetrar o significado, tão profundo e tão misterioso, dessa manifestação tão simples, tão humilde e tão bela, do Filho de Deus. Talvez se aprenda até, insensivelmente, a imitá-lo. Aqui se aprende o método que nos permitirá compreender quem ó o Cristo. Aqui se descobre a necessidade de observar o quadro de sua permanência entre nós: ... tudo de que Jesus se serviu para revelar-se ao mundo.

A nossa Nazaré

Se quisermos entender quem é Jesus, façamos o caminho inverso daquele palmilhado por seus conterrâneos. Olhemos para a “nossa Nazaré”, na qual o Cristo sempre se revela. Nazaré é hoje o nosso lugar, a nossa vida, a nossa cruz. Aqui Jesus se esconde a retorna para nos buscar. A fé vivida na comunidade tem a ver com essa experiência de Jesus, com esse lugar que Ele deseja ocupar. O lugar dos pequenos e dos frágeis que, segundo a norma da fé, não mais nos entristece, mas nos alegra. Com o Apóstolo Paulo, comprazendo-nos “nas fraquezas, nas injúrias, nas necessidades, nas perseguições e nas angústias sofridas”, assim encontraremos o caminho trilhado por Jesus e encontraremos sua força.

5- LIGANDO A PALAVRA COM A AÇÃO EUCARÍSTICA

A Palavra de Deus hoje nos convida a renovar nossa adesão a Jesus, consagrando-nos mais generosamente à cauda do Reino de Deus.

Esta nossa profissão de fé nos leva a confirmar que seguimos aquele que foi rejeitado por ser trabalhador, filho de Maria, uma pessoa comum de seu tempo, vindo de uma aldeia e, por isso, motivo de desprezo e rejeição.

Movidos por essa fé, nos reunimos em assembléia celebrante onde, pela sua Palavra, Jesus nos leva a assumir nossa evidente fragilidade sem precisar mascará-la com falsa grandeza e a buscar em sua graça a nossa força. Hoje, particularmente, nossas preces precisam expressar esta realidade.

Acima de qualquer expectativa humana, o Senhor manifesta sua grandeza na singeleza do pão e do vinho, frutos da terra e do nosso trabalho. Na simplicidade da partilha entre nós, ele nos confirma no seu caminho. É em nossa fraqueza que Deus continua manifestando sua força.

6. ORIENTAÇÕES GERAIS

1. Cada ministério litúrgico seja exercido com verdadeira humildade e espírito de serviço. Todo batizado é um anunciador do Pai, e também profeta. Na celebração litúrgica, alguns são chamados a colocar-se a serviço da Igreja e da comunidade reunida, como proclamadores da Palavra divina. Deus serve-se da voz dos leitores e salmistas para falar à assembléia, isto é, Deus fala pela boda dos leitores e salmistas. Quem exerce este ministério é sinal vivo da Palavra.

2. As pessoas que forem proclamar as leituras sejam devidamente preparadas. Elas têm a dignidade do próprio Cristo, que é quem nos convoca e fala a seu povo. Leia-se compassadamente. Cuidemos sempre para que os leitores, equipe de canto e salmistas sejam pessoas com um mínimo de formação bíblica e litúrgica e que, efetivamente, vivam a fé que proclamam.

3. É preciso valorizar o uso da veste litúrgica por leitores e salmistas, pois ela torna visível o serviço de quem proclama a Palavra, ela é a marca da função ministerial, isto é, colocar-se a serviço de Deus e da assembléia orante.

4. Lembrar que dia 09 de julho, a Igreja no Brasil faz memória de Santa Paulina do Coração Agonizante de Jesus. Ela foi beatificada pelo papa João Paulo II, em 1991, quando ele visitou oficialmente o Brasil. Depois o mesmo papa a canonizou em 2002. Assim, Madre Paulina tornou-se a primeira Santa do Brasil. No dia 11 é dia do abade São Bento, patriarca do monaquismo ocidental.

7- MÚSICA RITUAL

O canto é parte necessária e integrante da liturgia. Não é algo que vem de fora para animar ou enfeitar a liturgia. Por isso devemos cantar a liturgia e não cantar na liturgia. Os cantos e músicas, executados com atitude espiritual e, condizentes com cada domingo do Tempo Comum, ajudam a comunidade a penetrar no mistério celebrado. Portanto, não basta só saber que os cantos são do 14º Domingo do Tempo Comum, é preciso executá-los com atitude espiritual. A escolha dos cantos deve ser cuidadosa, para que a comunidade tenha o direito de cantar o mistério celebrado. Jamais os cantos devem ser escolhidos para satisfazer o ego de um grupo ou de um movimento ou de uma pastoral. Não devemos esquecer que toda liturgia é uma celebração da Igreja corpo de Cristo e não de um grupo, de uma pastoral ou de um movimento.

Antes da celebração, evitar a correria e agitação da equipe litúrgica e a equipe de canto, com afinação de instrumentos e testes de microfone. Tudo isso deve ser feito antes. A equipe de canto não deve ficar fazendo apresentação de cantos para entretenimento da assembléia É importante criar um clima de silêncio orante.

1. Canto de abertura.  Recebemos, ó Deus, a vossa misericórdia no meio do vosso templo (Salmo 47/48/10-11). Para o canto de abertura, sugerimos este Salmo. “No meio da tua casa recebemos, ó Deus, a tua graça!”, CD: Liturgia VI, melodia da faixa 19. As estrofes são do Salmo 32/33, nos convida a alegrar-nos no Senhor que é bom, que cumpre o que promete. Outra opção seria outra versão desse mesmo salmo: “Nós recebemos, Deus, vossa misericórdia no interior de vosso templo”, Hinário Litúrgico III da CNBB, página 384.

Ensina a Instrução Geral do Missal Romano que o canto de abertura tem por objetivo, além de unir a assembléia, inseri-la no mistério celebrado (IGMR nº 47). Nesse sentido o Hinário Litúrgico III da CNBB nos oferece uma ótima opção, que estão gravados no CD: Liturgia VI.

2. Ato penitencial. “Senhor, servo de Deus, que libertastes a nossa fraqueza”, CD: Partes Fixas Ordinário da Missa, melodia da faixa 2. A letra é muito oportuna para este 14º Domingo do Tempo Comum

3. Hino de louvor. “Glória a Deus nas alturas...” Vejam o CD Tríduo Pascal I e II e também no CD Festas Litúrgicas, Partes fixas do Ordinário da Missa do Hinário Litúrgico III da CNBB e também a versão da CNBB musicado por Irmã Miria e outros compositores.

O Hino de louvor “Glória a Deus nas alturas” é antiqüíssimo e venerável, com ele a Igreja, congrega no Espírito Santo, glorifica e suplica a Deus e ao Cordeiro. Não é permitido substituir o texto desse hino por outro (cf. IGMR n. 53). O CD: Festas Litúrgicas I propõe, na faixa 2, uma melodia para esse hino que pode ser cantado de forma bem festivo, solista e assembléia. Ver também nos outros CDs que citamos acima.

4. Salmo responsorial 122/123. Prece do homem saturado do desprezo dos zombadores. “Os nossos olhos estão fitos no Senhor: tende piedade, ó Senhor, tende piedade!”, mesma melodia da faixa 7 do CD: Liturgia IX.

A função do salmista é de suma importância. Sua função ministerial corresponde à função dos leitores e leitoras, pois o salmo é também Palavra de Deus posta em nossa boca para respondermos à sua revelação. Por isso, o salmo dever ser proclamado do Ambão e, se possível, cantado.

5. Aclamação ao Evangelho. O Espírito profético em Jesus: evangelizar os pobres. (Lucas 4,18) ou “E o Verbo se fez carne e habitou entre nós...” (João 1,14.12)  “Aleluia... Já se fez carne, o Verbo encarnou a sua tenda entre nós levantou”, CD: Liturgia VII, mesma melodia da faixa 7. O canto de aclamação ao evangelho acompanha os versos que estão no Lecionário Dominical.

Preserve-se a aclamação ao Evangelho cantando o texto proposto pelo Lecionário Dominical. Ele ajudará a manifestar o sentido litúrgico da celebração, conforme orientações da Igreja na sua caminhada litúrgica.

6. Apresentação dos dons.  A Palavra semeada em nosso coração, nos chama à conversão. A prova da conversão é a partilha. Devemos ser oferenda com as nossas  oferendas. “Bendito e louvado seja o Pai nosso criador”, CD: Liturgia VI, melodia da faixa 14.

7. Canto de comunhão. “Um profeta só não é estimado em sua pátria, entre seus parentes e familiares” (Marcos 6,4). “Quantas vezes, Senhor, desprezamos tua voz que nos quer libertar”, CD: Liturgia VI, mesma melodia da faixa 16. Outra ótima opção é Romanos 8,35-39, o famoso cântico de Paulo: “Quem nos separará? Quem vai nos separar do amor de Cristo?”, CD: Cantos de Abertura e Comunhão, melodia da faixa 21 ou CD: Festas Litúrgicas II, faixa 19. Sem dúvida, estes dois cantos são os mais adequados pra esse Domingo.

O Canto de Comunhão “Quem nos separará”, isto é, O Cântico de Paulo, Romanos 8, do Hinário Litúrgico da CNBB, III, página 368 gravado pela Paulus, também articula-se com a Liturgia da Palavra, o que permite estabelecer e experimentar a unidade das duas mesas, considerando a Liturgia um único ato de culto. O canto de comunhão deve retomar o sentido do Evangelho do dia. Esta é a sua função ministerial. Na realidade, aquilo que se proclama no Evangelho nos é dado na Eucaristia, ou seja: é o Evangelho que nos dá o “tom” com o qual o Cristo se dirige a nós em cada celebração eucarística reforçando estes conteúdos bíblico-litúrgicos, garantindo ainda mais a unidade entre a mesa da Palavra e a mesa da Eucaristia.

8- ESPAÇO CELEBRATIVO

            1. Prepara o espaço da celebração bem festivo, porque cada Domingo é Páscoa semanal. Os enfeites não podem ofuscar as duas mesas principais: mesa da Palavra e o altar.

2. “O altar dentro da Igreja goza da mais alta dignidade, merece toda honra e distinção, pois nele se realiza o mistério Pascal de Cristo, do qual é o símbolo por excelência. Pela sua dignidade e valor simbólico, o altar não pode ser um móvel qualquer ou uma peça sem expressão, mas precisa ser nobre, belo, digno, plasticamente elegante. Nada se sobrepõe ao altar. Ele pode ser realçado com a toalha, as velas, a cruz processional, as flores. Todos estes elementos devem enfatizar a sua nobreza e sobriedade, sem escondê-lo ou dificultar as ações litúrgicas”.

3. Os detalhes merecem cuidado especial, pois nunca devem se sobrepor ao essencial. As flores por exemplo, não são mais importantes que o altar, o ambão e outros lugares simbólicos. Nem a toalha é mais importante que o altar. Os excessos desvalorizam os sinais principais. A sobriedade da decoração favorece a concentração no mistério celebrado” (Guia Litúrgico Pastoral, página 110).

9. AÇÃO RITUAL

Valorizar os ritos iniciais da celebração, como momento de reunião de irmãos, constituindo uma assembléia de iguais. Fazer uma alegre acolhida das pessoas. Valorizar também a participação de pessoas deficientes. Muitas ainda sofrem rejeição na família, na sociedade e mesmo na comunidade.

Ritos Iniciais

1. É importante que não se diga nenhuma palavra antes da saudação: nem “Bom dia ou “Boa noite”, nem comentários ou introduções! Bom dia e boa noite não é saudação. Primeiro devemos saudar a Trindade.

2. O sinal-da-cruz é a primeira ação litúrgica do povo de Deus reunido para celebrar a Eucaristia. Fazer de maneira orante para que a assembléia se sinta abraçada pela Santíssima Trindade.

3. A pós a saudação o presidente ou o diácono ou outra pessoa pode dar o sentido litúrgico da celebração com estas palavras ou outras semelhantes:

Domingo do profeta Jesus nas sinagoga de Nazaré. Testemunhando a dificuldade do povo de Nazaré em acolher Jesus, somos chamados a crer no Senhor. Jesus volta à sua terra, acompanhado de seus discípulos. Celebramos a Páscoa de Jesus Cristo que se manifesta na vida de Jesus rejeitado em sua própria terra, e na vida de todas as pessoas que são excluídas.
4. Em seguida fazer a recordação da vida trazendo os fatos que são as manifestações da Páscoa do Senhor na vida da comunidade, do país e do mundo, mas de forma orante e não como noticiário.

5. O Ato Penitencial na Missa pode ser concebido como uma atitude de confiança e esperança na misericórdia do Senhor que socorre os seus na sua fraqueza e limitação. O amor visceral do Senhor (misericórdia, segundo Lucas 1,78) nos alcança. Essa é a experiência da piedade divina. Lembrando-nos que piedade é a tradução de “pietas” que em latim traduz o grego “eleos”, palavra conservada ainda no Kyrie “eleison”, significando o carinho de Deus para com suas criaturas e a confiança dessas em sossegar-se em seu aconchego. Não confundir o Ato penitencial com pedidos de perdão como muitas vezes acontece. Nunca dizer: Vamos fazer o Ato penitencial pedindo perdão dos nossos pecados.

6. Sugerimos que a motivação para o Ato Penitencial seja a fórmula I da página 391 do Missal Romano:

No início desta celebração eucarística, peçamos a conversão do coração, fonte de reconciliação e comunhão com Deus e com os irmãos e irmãs.

Após uns momentos de silêncio cantar:

Senhor, servo de Deus, que libertastes a nossa vida, tende piedade de nós!
(CD: Partes Fixas, Ordinário da Missa, melodia da faixa 2).

7. Cantar de maneira festiva o Hino de louvor (glória).

8. A Oração do Dia nos leva a reconhecer que a humilhação de Cristo é instrumento de salvação. Peçamos a Deus que nos enche de santa alegria. O Pai realizou seu plano, na suprema fraqueza do Cristo: sua morte na cruz.

Rito da Palavra

1. O Evangelho merece destaque especial. Fazer a proclamação com entusiasmo, seguida da apresentação do evangeliário para toda a assembléia.

2. Pode-se cantar como responso, após a homilia e o silêncio, o seguinte canto: “Dá-nos um coração grande para amar” (Ofício Divino das Comunidades, nº 430).

3. Pensando numa liturgia inculturada do Evangelho de Marcos, pode-se após a homilia e o responso, fazer a imposição das mãos nas pessoas doentes.

4. As preces, como ressonância da Palavra proclamada, sejam elevadas do Ambão, evitando-se formas indiretas: “para que...”, “pela nossa...”, “a fim de que...”. recordem o aspecto memorial e a suplica seja feita com base no que foi recordado. São formas de se valorizar a Palavra na celebração. Lembrar dos(as) “profetas” de hoje que também são rejeitados por causa de sua missão. Suplicar também para que o Senhor confirme a luta dos pobres em sua busca por libertação.

Rito da Eucaristia
1. Destacar toda a liturgia eucarística, momento em que o Pai nos entrega seu Filho como alimento e bebida. Toda sua grandeza se manifesta neste ato de entrega e doação a nós.

2. Na Oração sobre as o pão e o vinho suplicamos que nossa oferenda santificada por Deus, nos leve a vivenciar cada dia mais o Reino.

3. Sugerimos o Prefácio dos Domingos do Tempo Comum II, página 428 do Missal Romano sobre o mistério da salvação, manifesta mais claramente o mistério celebrado. Seguindo esta lógica, cujo embolismo reza: “Compadecendo-se da fraqueza humana, ele nasceu da Virgem Maria. Morrendo no lenho da Cruz, ele nos libertou da morte”. Pode ser também o Prefácio VII sobre a salvação pela obediência de Cristo. Vejamos também a lógica do embolismo: “E ele, na obediência até à morte, restaurou o que nossa desobediência fizera perder”, Missal Romano página 434. O grifo no texto identifica aqueles elementos em maior consonância com o Mistério celebrado neste Domingo e que pode ser aproveitado na própria, ao modo de mistagogia. Usando este prefácio, o presidente deve escolher a I ou a III Oração Eucarística. A II admite troca de prefácio. As demais não admitem um prefácio diferente.


Ritos Finais

1. Na Oração depois da comunhão suplicamos que enriquecidos pela comunhão eucarística, possamos sempre acolher os dons de Deus e nunca cessar seu louvor.

2. As palavras do rito de envio devem estar em consonância com o mistério celebrado: “Sejam profetas em todos os momentos das vossas vidas”. Ide em paz e o Senhor vos acompanhe!”

10- CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não podemos recuar, alegando que somos fracos, sem jeito ou sem coragem. Pois é justamente em tudo isso que Deus realiza e cumpre o seu reino, sua promessa de libertação e salvação. Mesmo que haja contradição, ou melhor, justamente quando há contradição, é que devemos firmar a nossa atitude, lembrando-nos de todos aqueles e aquelas que, com toda a sua fraqueza, se entregaram e se decidiram à missão cristã no mundo, não se valendo de si mesmos, mas também não duvidando da ação e da força divinas. Sabendo que para Deus não existe o fracasso. Que para Ele fracasso e vitória são uma coisa só.  Que o fracasso mais profundo foi o êxito definitivo do plano de Deus: a cruz de Jesus Cristo, transformada em ressurreição.

Celebremos a Páscoa semanal do Senhor valorizando os ministérios que existem dentro da casa de nossa comunidade.

O objetivo da Igreja e da nossa equipe diocesana de liturgia é ajudar os padres e as comunidades de nossa diocese e todas aquelas outras comunidades fora de nossa diocese que acessar nosso site celebrar melhor o mistério pascal de Cristo.

Um abraço fraterno a todos
           
Pe. Benedito Mazeti



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