domingo, 15 de fevereiro de 2015

O TEMPO DA QUARESMA

1- Alguns elementos históricos

“Na alegria do desejo espiritual, esperem a Santa Páscoa!” Com estas palavras de São Bento aos seus monges, a Igreja convida a todos a vivenciar a Quaresma como tempo de preparação para a Páscoa e também tempo de graça e de consolo.

A Quaresma está inserida dentro do Ciclo Pascal, cujo centro é a Páscoa. Na Páscoa fazemos memória do grande mistério da nossa fé: o mistério da morte e ressurreição de Jesus Cristo. Sabemos pela história que nos primeiros séculos do Cristianismo o mistério pascal era celebrado numa grande unidade, com destaque na Vigília Pascal.

Durante o primeiro período da história da Igreja, a Páscoa foi o único centro da pregação, da celebração e da vida cristã. Tudo foi visto no e do centro que é o evento de Cristo morto e ressuscitado. Na Páscoa se concentrava toda a vida e toda a obra da salvação de Cristo. Até o século IV permaneceu a visão global e unitária do mistério pascal com forte concentração no “Cristo crucificado, sepultado, ressuscitado” (Santo Agostinho).

A partir do século IV, por influência da comunidade de Jerusalém, começa a prevalecer o critério da historização dos relatos do Evangelho e, assim, passa-se a celebrar e contemplar cada momento da paixão, morte e ressurreição. Dessa forma, nasce a Semana Santa. Começou a celebrá-la na quinta-feira com a instituição da Eucaristia. A celebração do batismo na noite pascal contribuiu para criar um “antes” e um “depois” da celebração do Tríduo Pascal. Com as conversões em massa a partir do imperador Constantino (ano 313), a noite pascal passou a ser a grande noite batismal do ano. Na manhã de quinta-feira acrescentou-se a Missa do Crisma. Nasceu assim a Quaresma como tempo de preparação dos catecúmenos para o batismo e preparação dos penitentes para a reconciliação na manhã da quinta-feira santa.

Precisamos ainda ter presente que as raízes do catolicismo popular no Brasil estão na Idade Média européia, tendo chegado até nosso continente através da colonização empreendida pelos países da Península Ibérica. O catolicismo ibérico foi absorvendo as religiões indígenas que, aos poucos, foram perdendo o seu mundo religioso. Nessa religiosidade popular a contribuição do catolicismo português se tornou a marca dominante.

A cristologia ibérica acentuou de maneira muito forte a divindade de Jesus em prejuízo da sua humanidade. Na Península Ibérica o Cristianismo chegou através da heresia ariana, a qual afirmava ser Cristo menor do que o Pai. Em reação a isso o catolicismo hispânico acentuou fortemente a divindade de Jesus, deixando de lado a sua dimensão humana. Criou-se uma imagem do Cristo totalmente divinizado, e desapareceu a idéia de Jesus Cristo, irmão, solidário, que convive com os pobres, os doentes e luta em favor da implantação de um novo Reino. Formou-se, dessa forma, um vazio na mediação entre Deus e o povo. Na busca de mediadores, o recorreu aos santos, em especial à Virgem Maria.

Essa breve visão histórica nos ajuda a entender o descompasso que ainda persiste entre liturgia oficial, religiosidade popular e Campanha da Fraternidade.

2- Alguns elementos teológicos.

Com a Quarta-feira de Cinzas, inicia a Quaresma e também a Campanha da Fraternidade. É um retiro espiritual de 40 dias. A quaresma é um tempo em que damos maior liberdade para Deus agir em nós. As cinzas que pobremente recebemos em nossas cabeças, lembram a nossa condição humana que é transitória e abre a porta de entrada para o caminho da Quaresma que nos prepara para a Páscoa da Ressurreição. A Quarta-feira de Cinzas, porta de entrada da Quaresma, começa denunciando as deficiências graves de nosso mundo: a falta de coração puro.

A Quaresma começa na Quarta-Feira de cinzas e termina na Quinta-Feira Santa pela manhã. A Missa do Lava-pés faz parte do Tríduo Pascal e já está fora da Quaresma. Isso mostra que as festividades da Páscoa começam na Quinta-Feira Santa.

Do ponto de vista físico, sabemos que as cinzas são o produto destruído da combustão das coisas vivas. A vida está presente nas plantas, com a morte e a combustão, tornam-se cinzas, símbolo de aniquilamento e de morte. As cinzas representam também a escuridão, pois elas estão presentes no apagamento da luz do fogo. Esse símbolo trágico é assumido pela Igreja, para manifestar a realidade do ser humano quando falta a presença de Deus em sua vida. Nos povos primitivos, as cinzas representam a combustão da vida, a passagem ao reino dos mortos. No livro de Jó (42,6), simbolizam o sofrimento, o luto e o remorso. No Cristianismo, tem a função pedagógica de perceber a fragilidade humana e converter os fiéis à penitência e à conversão de vida. A sacralização das cinzas, colocadas em forma de cruz, une os fiéis aos ritos de passagem e purificação pelo fogo vivo do Espírito Santo.

A imposição das cinzas é um rito antigo, mas não é antiquado e encerra uma mensagem espiritual. Não é somente um símbolo do nosso aniquilamento, e menos ainda um gesto doentio e masoquista. É também, e sobretudo, um sinal de começo de vida e renovação. Com as cinzas começamos o caminho para a Páscoa.

A cinza desta quarta-feira é a cinza de ressurreição. Deus é capaz de tirar vida da morte e ressurreição das cinzas, como brota a planta de um grão que morre na terra. Receber as cinzas na quarta-feira significa inscrever-se na escola de conversão que a Igreja inaugura no tempo da Quaresma.

A celebração da Quarta-feira de Cinzas teve início a partir do final do século V e então começa a fazer parte da Quaresma. No começo só os penitentes recebiam as cinzas na quarta-feira, só mais tarde é que foi estendida a todos os cristãos. Pelo Sacramentário Gelasiano sabemos que os penitentes entram em rígido “retiro espiritual” na Quarta-feira de Cinzas até na Quinta-feira Santa, e que a Quarta-feira de Cinzas é considerada como início da Quaresma.

É importante observar que a “Quarta-feira de Cinzas não poderá reduzir-se ao simples rito de distribuir as cinzas, mas deve tomar um cunho de entrada na Quaresma que poderá ser um encaminhamento para uma celebração penitencial a ser realizada sacramentalmente em tempo oportuno” (Pastoral da Penitência, doc. da CNBB, pág. 42). Seria como que uma marca bem forte, um selo que inaugura a Quaresma.

Iniciamos na Quarta-feira de cinzas, a grande celebração anual da Páscoa, num único tempo pascal. Esta grande celebração pascal tem a Quaresma como primeira parte. Não se trata de primeiro celebrar a Cruz e depois a Ressurreição. Apesar de que na prática das celebrações esse processo acontece, não devemos separar uma coisa da outra, isto é, não podemos separar a Cruz da Ressurreição. Quando Jesus aparece aos seus discípulos após a ressurreição, ele mostra-lhes as mãos e o lado. Isto significa que o Ressuscitado é o Crucificado e o Crucificado é o Ressuscitado, isto é, era a mesma pessoa (João 20,20; 25-27). No Evangelho de Lucas Jesus aparece após a ressurreição e mostra aos seus discípulos as mãos e os pés e os introduz na plenitude da mensagem da Páscoa. Tanto em São João com em São Lucas, trata-se das chagas da crucificação que o Cristo ressuscitado mostra a eles. Portanto, não podemos separar a paixão e a morte da ressurreição. É uma união indissolúvel.

Quaresma e Páscoa, portanto, são dois tempos profundamente ligados entre si. Celebram o mesmo e único mistério sob aspectos diferentes, muito bem expressos por Santo Agostinho: “ ... foi instituída a celebração de dois tempos: um antes da Páscoa e outro depois da Páscoa. O tempo precedente à Páscoa figura a tribulação em que nos achamos; o que celebramos após a Páscoa lembra a felicidade futura em que nos acharemos. Antes da Páscoa, portanto, celebramos o que vivemos; depois da Páscoa celebramos, assinalando, o que ainda não temos. Por isso, no primeiro tempo exercitamo-nos em jejuns e orações; agora, terminados os jejuns, passamos o tempo em louvores. Tal é o sentido do Aleluia que cantamos. Aleluia se traduz para o latim, como sabeis, por: ‘Louvai ao Senhor’. O primeiro tempo, portanto, representa a fase anterior à ressurreição; o segundo, a posterior à ressurreição do Senhor. Significa a vida futura, que ainda não possuímos”.

Fazemos o memorial da Cruz e da paixão do Senhor, em cada celebração, o ano todo, seja na festa do Natal, seja na Epifania, seja em Pentecostes. Na Quaresma, acentuamos da Páscoa, o aspecto mais de “saída da escravidão”, a libertação de tudo o que aniquila a vida humana; e a partir da festa da Ressurreição até Pentecostes, damos graças e festejamos as coisas novas que o Senhor já fez em nós com a força da Ressurreição. Assim continuamos a celebrar a libertação, mas agora olhando não só de que somos libertados, mas “para que somos libertos”, isto é, agora somos libertadores. A Quaresma está inserida dentro do ciclo pascal, cujo centro é a Páscoa.

Os cristãos do século II se preparavam para a festa da Páscoa com um jejum de pesar de dois dias: Sexta-feira Santo a Sábado Santo. Esse Tríduo tinha início na Sexta-feira Santa (morte do Senhor) e, passando através do Sábado Santo (deposição do Senhor no sepulcro), culminava na Vigília Pascal e no dia da Ressurreição (na aurora do domingo de Páscoa). Isso nós recebemos da tradição Apostólica de Hipólito de Roma. Esse jejum se estendeu a toda a semana, no século III na Igreja de Alexandria no Egito.

A Quaresma nasceu entre os monges no Egito. No início do século IV é que se organiza um período de preparação para a Páscoa de três semanas e foi assumida pela liturgia romana como preparação para a Páscoa. Durante estas três semanas proclamava-se o Evangelho de São João. Esse fato é muito interessante, pois a leitura joanina era caracterizada por trechos referentes à proximidade da Páscoa e à presença de Jesus em Jerusalém. O historiador Sócrates nos informa que nos primeiros descênios do século V, em Roma, a Páscoa era precedida de três semanas de preparação. A preparação para a Páscoa de seis semanas, isto é, de quarenta dias, pelo testemunho de Pedro de Alexandria (+311), começou pouco antes do ano 384. Tinha caráter de elevação das virtudes cristãs e isto se explica pela introdução, na Quinta-Feira Santa, da prática da reconciliação dos penitentes que se tinham preparado para a Páscoa.

O símbolo litúrgico do número 40 tem uma significação muito interessante. Na tradição religiosa é o número da espera, da preparação, da provação e do aniquilamento. Os escritos bíblicos descrevem a história do povo aplicando esta simbologia, assim temos o reinado de Davi por quarenta anos (2Samuel 5,4); e também o reinado de Salomão (1Reis 11,42). Temos os quarenta dias e quarenta noites de chuva no dilúvio (Gênesis 7,17); Moisés é convocado por Deus aos quarenta anos; quarenta anos de caminhada do povo pelo deserto; quarenta dias de Moisés no Monte Sinai ( Êxodo 34,28); quarenta dias de afronto de Golias contra o povo até quando Davi o enfrentou e o abateu (1Samuel 17,16); quarenta dias de caminhada de Elias para o monte de Deus, o Horeb (1Reis 19,8); quarenta dias da pregação de Jonas em Nínive (Jn3,4). E lembramos principalmente o retiro de quarenta dias de Jesus no deserto (Mateus 4,1-11; Macos 1,12-13; Lc 4,1-13). Jesus pregou quarenta meses morreu e ressuscitou e volta ao Pai depois de quarenta dias de ressurreição. Este número está presente em tantas outras passagens bíblicas.

Trata-se de um número simbólico, certamente, mas nos convida a voltarmos para Deus, neste tempo de Quaresma, como foi o convite feito por Jonas durante sua pregação ao povo de Nínive, que teve quarenta dias para se converter e alcançar a misericórdia de Deus (Jonas 3,1-16).

A teologia da Quaresma tem seu sentido verdadeiro no mistério pascal de Jesus Cristo, que culmina no Tríduo Pascal e que é o fundamento de todas as nossas celebrações cristãs.

A Sacrossanctum Concilium nos diz, no número 109: “Tanto na liturgia quanto na catequese litúrgica esclareça-se melhor a dupla índole do tempo quaresmal, que, principalmente pela lembrança ou preparação do batismo e pela penitência, fazendo os fiéis ouvirem com mais freqüência a Palavra de Deus e entregarem-se à oração, os dispõe à celebração do mistério pascal”.

Na Quaresma, portanto, somos convidados a fazer uma verdadeira experiência na participação do mistério pascal de Jesus Cristo. Sofremos com Cristo para participar de sua glória (cf. Romanos 8,17).

A Quaresma tem caráter essencialmente batismal, sobre o qual se baseia o caráter penitencial. Na verdade, a Igreja é comunidade pascal porque é batismal. Isso deve ser afirmado não só no sentido de que nela entramos mediante o batismo, mas principalmente no sentido de que a Igreja é chamada a exprimir com vida de contínua conversão o sacramento que gera. Daí também o caráter eclesial da Quaresma. Ela é o tempo de grande convocação de todo o povo de Deus, para que se deixe purificar e santificar pelo seu Salvador e Senhor.

Durante a Quaresma somos convidados a percorrer um itinerário pedagógico e catequético que nos faz penetrar nos grandes eventos da história da salvação. Durante as cinco semanas da Quaresma, na liturgia da Palavra, escutamos a atualizamos os textos bíblicos que eram fonte de estudo e compromisso dos catecúmenos nos primeiros séculos do Cristianismo.

3- Espiritualidade quaresmal

Por várias razões a Quaresma tem sido às vezes considerada como um tempo de fechamento e de tristeza e também carregado de superstições. No entanto, a característica essencial da Quaresma deveria ser a de um tempo de austeridade e penitência, sim, mas que jamais deveria ser confundido com ausência de alegria. “Quando jejuardes, não fiqueis como rosto triste como os hipócritas. Tu, porém, quando jejuares, perfuma a cabeça e lava o rosto, para que os homens não vejam que tu estás jejuando, mas somente teu Pai, que está oculto” (Mateus 6,16-18). É certo que temos de fazer penitência, é certo que o seguimento de Cristo nos pede renúncias dolorosas, em certas ocasiões; no entanto a alegria de nos assemelharmos a Jesus Cristo ressuscitado tem de produzir em nós um regozijo maior. A penitência quaresmal por isso deve ter sempre uma dimensão de prazer e alegria. Nesse sentido é importante resgatar o verdadeiro sentido, dando um sentido mais pascal a certas práticas e gestos que fazemos.

Seria muito interessante que na Quaresma pudesse ser para as comunidades cristãs, algo correspondente ao que, para as escolas de samba e blocos de carnaval, é o tempo de treinamento e concentração necessário à grande festa do carnaval. Já desde o fim do carnaval deste ano, se prepara o próximo desfile.

Um exercício libertador seria abrir-nos mais à escuta da Palavra de Deus, confrontando-a com nossa vida e participarmos mais ativa e efetivamente nas celebrações litúrgicas. O essencial é que haja em nós uma verdadeira metanoia, ou seja, a conversão do coração e da mente, em todos os aspectos da nossa vida cotidiana. A prática da penitência deve ser encarada não só no sentido individual, mas na sua dimensão comunitária, percebendo a dimensão social do pecado e suas conseqüências na vida da comunidade e da sociedade.

A prática do jejum, no tempo da Quaresma, precisa ser redescoberta. Trata-se não só de privar-se da questão de alimentos, mas também de fazer uma contestação a tantas comodidades que a vida moderna nos oferece. Seria reforçar o nosso autodomínio, cuidar da nossa saúde, não desperdiçar, não entrar na onda do consumismo desenfreado e se abrir e partilhar com quem precisa da nossa solidariedade. Podemos encarar o jejum no sentido de renúncia.

O saudoso Pe. Geraldo Leite orientava sua comunidade para “jejuns” bem específicos:

* jejum da língua: evitar de falar o que não se deve... fofocas, maledicências... (primeira
   semana);

* jejum dos passos: evitar freqüentar lugares inconvenientes a um bom cristão (segunda
   semana);

* jejum da vista: por exemplo, evitar novelas e certos programas de TV para participar
   dos encontros durante a semana, via-sacra, caminhadas penitencias, ... (terceira
   semana);

* jejum do gosto: em comunhão com os que passam fome, evitar aqueles alimentos que
   mais apreciamos, como doces, sorvetes... (quarta semana);

* jejum do coração: buscar sempre o desapego das coisas que nos atrapalham de entrar no
   seguimento de Jesus Cristo... (quinta semana).

Durante a Quaresma a oração também deveria adquirir um novo sentido. Deveria não só ampliar a intensidade da oração individual e comunitária, mas também rezar em espírito e verdade, isto é, abrir-nos para o desejo de Deus em nós, para a gratuidade e o perdão, acolhendo a ternura e o abraço carinhoso de Deus que quer fazer de nós novas criaturas.

Irmã Penha Carpanedo e Pe. Marcelo Guimarães têm uma explicação excelente para a Quaresma: “Celebrar a Quaresma é festejar o refazer da aliança de Deus com a gente e que o nosso pecado e nossa negligência romperam. É renunciar aos nossos instintos egoístas e abrir-nos mais ao plano do Deus da vida. Celebrar a Quaresma é intensificar a oração, o jejum e a caridade, para vivermos mais consagrados ao Deus que nos reconciliou com ele. Celebrar a Quaresma é deixar-se conduzir ao deserto, para que o Senhor nos fale ao coração. É rever as linhas de conduta, corrigir os erros de trajetória, aprofundar a unidade entre nós. É assumir e reconhecer o negativo, a morte, o sofrimento, para vencê-los e superá-los. Como o grão de trigo que morre para nascer. Como a mulher que está para dar à luz e sofre as dores de parto. Como a uva que se esmaga para fazer o vinho que alegra a nosso coração.”

Podemos também comparar com a vela que se acende. Para clarear ela derrama lágrimas para que todos possam contemplar a beleza da claridade.
A espiritualidade quaresmal é caracterizada também por uma atenção, profunda e prolongada da Palavra de Deus. É esta Palavra que ilumina a vida e chama à conversão derramando em nós confiança na misericórdia de Deus.

É preciso urgentemente fazer da Quaresma um tempo favorável de avaliação de nossas opções de vida e linhas de trabalho, para corrigir os erros e aprofundar a vivência da fé cristã, abrindo-nos a Deus, ao próximo e realizando ações concretas de fraternidade e solidariedade.

A Quaresma é um tempo forte de conversão, de mudança interior, tempo de deixar tudo o que é velho em nós, tempo de assumir tudo o que traz vida para todos nós, em nossas famílias, em nossas comunidades e em nossa sociedade.

Quaresma é:

* Tempo de nos abrir para a novidade que brota da Cruz de Cristo como sinal de nossa
   salvação.

* Tempo de sermos novas criaturas revivendo a atualizando nosso batismo e assim
   Confirmamos nossa pertença à Igreja, povo de Deus.

* Tempo de buscar a libertação do povo hoje tão sofrido e tão explorado e vítima de tanta
    corrupção, desmandos e descasos.

* Tempo de abandonar os ídolos modernos e de renovar nossa fidelidade ao Deus vivo e
    verdadeiro através da escuta atenta da sua Palavra.

* Tempo de subir ao monte Tabor com Jesus Cristo, viver na intimidade com Ele e alegrar
   com sua amizade e sua ternura.

* Tempo de descer para o chão da vida, ver o rosto transfigurado de Jesus no deficiente
   físico, no pobre, no doente, no injustiçado...

* Tempo de nos deixar tocar pelo amor misericordioso do nosso Deus.

* Tempo de ressuscitar com Cristo e nos colocar a serviço do seu Reino.

O Ano B de Marcos e o tema da Aliança.

Os temas do ano B chamam a nossa atenção para a Páscoa de Cristo. Nos dois primeiros domingos as leituras do Evangelho trazem o tema das tentações de Jesus e da transfiguração na visão de Marcos. Mesmo lendo nos dois primeiros domingos da Quaresma todos os anos os textos das tentações do deserto e da transfiguração de Jesus, o Lecionário Dominical nos propõe três caminhos quaresmais: um caminho batismal (ciclo A), um caminho cristocêntrico-pascal (ciclo B) e um caminho penitencial (ciclo C).

A finalidade deste ano do evangelista Marcos é ressaltar o tema da Aliança reconstruída. A maneira como o Pai reconstrói a Aliança rompida pelo pecado do paraíso. Portanto, a Nova Aliança, em Cristo, com o novo povo de Deus. No Espírito da Nova Aliança, as leituras orientam a reflexão litúrgica da Quaresma.

É impossível vivenciar toda a espiritualidade da Quaresma sem conhecer a liturgia deste tempo. A liturgia da Quaresma está dividida em três ciclos, cada ano um ciclo. Daí chamamos de ANO A, B e C. O ano A segue o Evangelho de Mateus que tem como característica o tema do Batismo (A Samaritana junto ao poço no Terceiro Domingo João 4,5-42, O Cego de nascença no Quarto Domingo João 9,1-41 e A Ressurreição de Lázaro no Quinto Domingo João 11 1-45. O Ano B segue o Evangelho de Marcos ressaltando o tema da Aliança e recai sobre a pessoa de Jesus (A Expulsão dos vendilhões do templo no Terceiro Domingo João 2,13-25, O Encontro com Nicodemos no Quarto Domingo João 3,14-21 e O Grão de trigo caído na terra no quinto domingo João 12,20-33. O Ano C apresenta o tema da Penitência e da Conversão bem evidenciados (A parábola da “Figueira estéril” no Terceiro Domingo Lucas 13,1-9, A parábola do “Filho pródigo” no Quarto Domingo Lucas 15, 1-3.11-32 e o episódio da “Mulher pecadora” no Quinto Domingo João 8,1-11.

O bom uso do Lecionário. O ciclo A é ligado com o Batismo. O ciclo B deste ano, com a Aliança. Na época em que foi preparado o Lecionário Dominical, diversos peritos julgavam que, para a Quaresma, seria suficiente só o ciclo A, porque seu alcance doutrinal é fundamental. Mas prevaleceu o parecer dos biblistas. Afinal chegou-se a uma decisão equilibrada. Nas comunidades onde há adultos que se preparam para os sacramentos da iniciação cristã (Batismo, Eucaristia e Crisma) na noite da Páscoa, deve-se utilizar o ciclo A, o qual, no entanto, quando se julgar oportuno, pode ser usado sempre como indica o próprio Lecionário Dominical, nas páginas 438, 442, 446, 752, 756 e 760. Mas, onde não houver adultos preparando-se para os sacramentos, poderão ser usados, conforme os anos, os ciclos B e C, porque a linha do ciclo A é fundamentalmente batismal.


A liturgia da Palavra vai nos apresentando na primeira parte da Quaresma o tema da conversão ou penitência, e na segunda parte a renovação batismal, para chegarmos à noite da Páscoa convertidos e renovados na opção do nosso Batismo. É apaixonante a tarefa que hoje propomos no caminho para a Páscoa.

O povo que havia desviado do projeto do Pai retorna a Ele. A conversão é deixar o passado e assumir, para o futuro, o projeto de amor. Converter-se significa “mudar de rumo”, ir em direção ao Senhor, que se faz presente em cada irmão e irmã que sofre.

Os dois primeiros domingos estão construídos como os anos A e C, isto é, Mateus e Lucas: tentação e vitória de Cristo (primeiro domingo); transfiguração (segundo domingo). Os evangelhos são tirados de Marcos.

Pe. Benedito Mazeti
Assessor diocesano de Liturgia

Bispado de São José do Rio Preto 

Nenhum comentário:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...