1- Alguns elementos históricos
“Na alegria do
desejo espiritual, esperem a Santa Páscoa!” Com estas palavras de São Bento aos
seus monges, a Igreja convida a todos a vivenciar a Quaresma como tempo de
preparação para a Páscoa e também tempo de graça e de consolo.
A Quaresma
está inserida dentro do Ciclo Pascal, cujo centro é a Páscoa. Na Páscoa fazemos
memória do grande mistério da nossa fé: o mistério da morte e ressurreição de
Jesus Cristo. Sabemos pela história que nos primeiros séculos do Cristianismo o
mistério pascal era celebrado numa grande unidade, com destaque na Vigília
Pascal.
Durante o
primeiro período da história da Igreja, a Páscoa foi o único centro da
pregação, da celebração e da vida cristã. Tudo foi visto no e do centro que é o
evento de Cristo morto e ressuscitado. Na Páscoa se concentrava toda a vida e
toda a obra da salvação de Cristo. Até o século IV permaneceu a visão global e
unitária do mistério pascal com forte concentração no “Cristo crucificado,
sepultado, ressuscitado” (Santo Agostinho).
A partir do
século IV, por influência da comunidade de Jerusalém, começa a prevalecer o
critério da historização dos relatos do Evangelho e, assim, passa-se a celebrar e contemplar cada momento da
paixão, morte e ressurreição. Dessa forma, nasce a Semana Santa. Começou a
celebrá-la na quinta-feira com a instituição da Eucaristia. A celebração do
batismo na noite pascal contribuiu para criar um “antes” e um “depois” da
celebração do Tríduo Pascal. Com as conversões em massa a partir do imperador
Constantino (ano 313), a noite pascal passou a ser a grande noite batismal do
ano. Na manhã de quinta-feira acrescentou-se a Missa do Crisma. Nasceu assim a
Quaresma como tempo de preparação dos catecúmenos para o batismo e preparação
dos penitentes para a reconciliação na manhã da quinta-feira santa.
Precisamos
ainda ter presente que as raízes do catolicismo popular no Brasil estão na
Idade Média européia, tendo chegado até nosso continente através da colonização
empreendida pelos países da Península Ibérica. O catolicismo ibérico foi
absorvendo as religiões indígenas que, aos poucos, foram perdendo o seu mundo
religioso. Nessa religiosidade popular a contribuição do catolicismo português
se tornou a marca dominante.
A cristologia
ibérica acentuou de maneira muito forte a divindade de Jesus em prejuízo da sua
humanidade. Na Península Ibérica o Cristianismo chegou através da heresia
ariana, a qual afirmava ser Cristo menor do que o Pai. Em reação a isso o catolicismo hispânico acentuou
fortemente a divindade de Jesus, deixando de lado a sua dimensão humana.
Criou-se uma imagem do Cristo totalmente divinizado, e desapareceu a idéia de
Jesus Cristo, irmão, solidário, que convive com os pobres, os doentes e luta em
favor da implantação de um novo Reino. Formou-se, dessa forma, um vazio na
mediação entre Deus e o povo. Na busca de mediadores, o recorreu aos santos, em
especial à Virgem Maria.
Essa breve
visão histórica nos ajuda a entender o descompasso que ainda persiste entre
liturgia oficial, religiosidade popular e Campanha da Fraternidade.
2- Alguns elementos teológicos.
Com a
Quarta-feira de Cinzas, inicia a Quaresma e também a Campanha da Fraternidade.
É um retiro espiritual de 40 dias. A quaresma é um tempo em que damos maior
liberdade para Deus agir em
nós. As cinzas que pobremente recebemos em nossas cabeças,
lembram a nossa condição humana que é transitória e abre a porta de entrada
para o caminho da Quaresma que nos prepara para a Páscoa da Ressurreição. A
Quarta-feira de Cinzas, porta de entrada da Quaresma, começa denunciando as
deficiências graves de nosso mundo: a
falta de coração puro.
A Quaresma
começa na Quarta-Feira de cinzas e termina na Quinta-Feira Santa pela manhã. A
Missa do Lava-pés faz parte do Tríduo Pascal e já está fora da Quaresma. Isso
mostra que as festividades da Páscoa começam na Quinta-Feira Santa.
Do ponto de
vista físico, sabemos que as cinzas são o produto destruído da combustão das
coisas vivas. A vida está presente nas plantas, com a morte e a combustão,
tornam-se cinzas, símbolo de aniquilamento e de morte. As cinzas representam
também a escuridão, pois elas estão presentes no apagamento da luz do fogo.
Esse símbolo trágico é assumido pela Igreja, para manifestar a realidade do ser
humano quando falta a presença de Deus em sua vida. Nos povos primitivos, as
cinzas representam a combustão da vida, a passagem ao reino dos mortos. No
livro de Jó (42,6), simbolizam o sofrimento, o luto e o remorso. No
Cristianismo, tem a função pedagógica de perceber a fragilidade humana e
converter os fiéis à penitência e à conversão de vida. A sacralização das
cinzas, colocadas em forma de cruz, une os fiéis aos ritos de passagem e
purificação pelo fogo vivo do Espírito Santo.
A imposição
das cinzas é um rito antigo, mas não é antiquado e encerra uma mensagem
espiritual. Não é somente um símbolo do nosso aniquilamento, e menos ainda um
gesto doentio e masoquista. É também, e sobretudo, um sinal de começo de vida e
renovação. Com as cinzas começamos o caminho para a Páscoa.
A cinza desta
quarta-feira é a cinza de ressurreição. Deus é capaz de tirar vida da morte e
ressurreição das cinzas, como brota a planta de um grão que morre na terra.
Receber as cinzas na quarta-feira significa inscrever-se
na escola de conversão que a Igreja inaugura no tempo da Quaresma.
A celebração
da Quarta-feira de Cinzas teve início a partir do final do século V e então
começa a fazer parte da Quaresma. No começo só os penitentes recebiam as cinzas
na quarta-feira, só mais tarde é que foi estendida a todos os cristãos. Pelo
Sacramentário Gelasiano sabemos que os penitentes entram em rígido “retiro
espiritual” na Quarta-feira de Cinzas até na Quinta-feira Santa, e que a
Quarta-feira de Cinzas é considerada como início da Quaresma.
É importante
observar que a “Quarta-feira de Cinzas não poderá reduzir-se ao simples rito de
distribuir as cinzas, mas deve tomar um cunho de entrada na Quaresma que poderá
ser um encaminhamento para uma celebração
penitencial a ser realizada
sacramentalmente em tempo oportuno” (Pastoral da Penitência, doc. da CNBB, pág.
42). Seria como que uma marca bem forte, um selo que inaugura a Quaresma.
Iniciamos na
Quarta-feira de cinzas, a grande celebração anual da Páscoa, num único tempo
pascal. Esta grande celebração pascal tem a Quaresma como primeira parte. Não
se trata de primeiro celebrar a Cruz e depois a Ressurreição. Apesar de que na
prática das celebrações esse processo acontece, não devemos separar uma coisa
da outra, isto é, não podemos separar a Cruz da Ressurreição. Quando Jesus
aparece aos seus discípulos após a ressurreição, ele mostra-lhes as mãos e o
lado. Isto significa que o Ressuscitado é o Crucificado e o Crucificado é o
Ressuscitado, isto é, era a mesma pessoa (João 20,20; 25-27). No Evangelho de
Lucas Jesus aparece após a ressurreição e mostra aos seus discípulos as mãos e
os pés e os introduz na plenitude da mensagem da Páscoa. Tanto em São João com em São Lucas , trata-se das
chagas da crucificação que o Cristo ressuscitado mostra a eles. Portanto, não
podemos separar a paixão e a morte da ressurreição. É uma união indissolúvel.
Quaresma e
Páscoa, portanto, são dois tempos profundamente ligados entre si. Celebram o
mesmo e único mistério sob aspectos diferentes, muito bem expressos por Santo
Agostinho: “ ... foi instituída a celebração de dois tempos: um antes da Páscoa
e outro depois da Páscoa. O tempo precedente à Páscoa figura a tribulação em
que nos achamos; o que celebramos após a Páscoa lembra a felicidade futura em
que nos acharemos. Antes da Páscoa, portanto, celebramos o que vivemos; depois
da Páscoa celebramos, assinalando, o que ainda não temos. Por isso, no primeiro
tempo exercitamo-nos em jejuns e orações; agora, terminados os jejuns, passamos
o tempo em louvores. Tal
é o sentido do Aleluia que cantamos.
Aleluia se traduz para o latim, como sabeis, por: ‘Louvai ao Senhor’. O
primeiro tempo, portanto, representa a fase anterior à ressurreição; o segundo,
a posterior à ressurreição do Senhor. Significa a vida futura, que ainda não
possuímos”.
Fazemos o
memorial da Cruz e da paixão do Senhor, em cada celebração, o ano todo, seja na
festa do Natal, seja na Epifania, seja em Pentecostes. Na Quaresma ,
acentuamos da Páscoa, o aspecto mais de “saída
da escravidão”, a libertação de tudo o que aniquila a vida humana; e a
partir da festa da Ressurreição até Pentecostes, damos graças e festejamos as
coisas novas que o Senhor já fez em nós com a força da Ressurreição. Assim
continuamos a celebrar a libertação, mas agora olhando não só de que somos
libertados, mas “para que somos libertos”,
isto é, agora somos libertadores. A Quaresma está inserida dentro do ciclo
pascal, cujo centro é a Páscoa.
Os cristãos do
século II se preparavam para a festa da Páscoa com um jejum de pesar de dois
dias: Sexta-feira Santo a Sábado Santo. Esse Tríduo tinha início na Sexta-feira
Santa (morte do Senhor) e, passando através do Sábado Santo (deposição do
Senhor no sepulcro), culminava na Vigília Pascal e no dia da Ressurreição (na
aurora do domingo de Páscoa). Isso nós recebemos da tradição Apostólica de
Hipólito de Roma. Esse jejum se estendeu a toda a semana, no século III na
Igreja de Alexandria no Egito.
A Quaresma
nasceu entre os monges no Egito. No início do século IV é que se organiza um
período de preparação para a Páscoa de três semanas e foi assumida pela
liturgia romana como preparação para a Páscoa. Durante estas três semanas
proclamava-se o Evangelho de São João. Esse fato é muito interessante, pois a
leitura joanina era caracterizada por trechos referentes à proximidade da
Páscoa e à presença de Jesus em
Jerusalém. O historiador Sócrates nos informa que nos
primeiros descênios do século V, em Roma, a Páscoa era precedida de três
semanas de preparação. A preparação para a Páscoa de seis semanas, isto é, de
quarenta dias, pelo testemunho de Pedro de Alexandria (+311), começou pouco
antes do ano 384. Tinha caráter de elevação das virtudes cristãs e isto se
explica pela introdução, na Quinta-Feira Santa, da prática da reconciliação dos
penitentes que se tinham preparado para a Páscoa.
O símbolo
litúrgico do número 40 tem uma significação muito interessante. Na tradição
religiosa é o número da espera, da
preparação, da provação e do aniquilamento. Os escritos bíblicos descrevem
a história do povo aplicando esta simbologia, assim temos o reinado de Davi por
quarenta anos (2Samuel 5,4); e também o reinado de Salomão (1Reis 11,42). Temos
os quarenta dias e quarenta noites de chuva no dilúvio (Gênesis 7,17); Moisés é
convocado por Deus aos quarenta anos; quarenta anos de caminhada do povo pelo
deserto; quarenta dias de Moisés no Monte Sinai ( Êxodo 34,28); quarenta dias
de afronto de Golias contra o povo até quando Davi o enfrentou e o abateu (1Samuel
17,16); quarenta dias de caminhada de Elias para o monte de Deus, o Horeb (1Reis
19,8); quarenta dias da pregação de Jonas em Nínive (Jn3,4). E lembramos
principalmente o retiro de quarenta dias de Jesus no deserto (Mateus 4,1-11; Macos
1,12-13; Lc 4,1-13). Jesus pregou quarenta meses morreu e ressuscitou e volta
ao Pai depois de quarenta dias de ressurreição. Este número está presente em
tantas outras passagens bíblicas.
Trata-se de um
número simbólico, certamente, mas nos convida a voltarmos para Deus, neste
tempo de Quaresma, como foi o convite feito por Jonas durante sua pregação ao
povo de Nínive, que teve quarenta dias para se converter e alcançar a
misericórdia de Deus (Jonas 3,1-16).
A teologia da
Quaresma tem seu sentido verdadeiro no mistério pascal de Jesus Cristo, que
culmina no Tríduo Pascal e que é o fundamento de todas as nossas celebrações
cristãs.
A
Sacrossanctum Concilium nos diz, no número 109: “Tanto na liturgia quanto na
catequese litúrgica esclareça-se melhor a dupla índole do tempo quaresmal, que,
principalmente pela lembrança ou preparação do batismo e pela penitência,
fazendo os fiéis ouvirem com mais freqüência a Palavra de Deus e entregarem-se
à oração, os dispõe à celebração do mistério pascal”.
Na Quaresma,
portanto, somos convidados a fazer uma verdadeira experiência na participação
do mistério pascal de Jesus Cristo. Sofremos com Cristo para participar de sua
glória (cf. Romanos 8,17).
A Quaresma tem
caráter essencialmente batismal, sobre o qual se baseia o caráter penitencial.
Na verdade, a Igreja é comunidade pascal porque é batismal. Isso deve ser
afirmado não só no sentido de que nela entramos mediante o batismo, mas
principalmente no sentido de que a Igreja é chamada a exprimir com vida de
contínua conversão o sacramento que gera. Daí também o caráter eclesial da
Quaresma. Ela é o tempo de grande convocação de todo o povo de Deus, para que
se deixe purificar e santificar pelo seu Salvador e Senhor.
Durante a
Quaresma somos convidados a percorrer um itinerário pedagógico e catequético
que nos faz penetrar nos grandes eventos da história da salvação. Durante as
cinco semanas da Quaresma, na liturgia da Palavra, escutamos a atualizamos os
textos bíblicos que eram fonte de estudo e compromisso dos catecúmenos nos
primeiros séculos do Cristianismo.
3- Espiritualidade quaresmal
Por várias
razões a Quaresma tem sido às vezes considerada como um tempo de fechamento e
de tristeza e também carregado de superstições. No entanto, a característica
essencial da Quaresma deveria ser a de um tempo de austeridade e penitência,
sim, mas que jamais deveria ser confundido com ausência de alegria. “Quando
jejuardes, não fiqueis como rosto triste como os hipócritas. Tu, porém, quando
jejuares, perfuma a cabeça e lava o rosto, para que os homens não vejam que tu
estás jejuando, mas somente teu Pai, que está oculto” (Mateus 6,16-18). É certo
que temos de fazer penitência, é certo que o seguimento de Cristo nos pede
renúncias dolorosas, em certas ocasiões; no entanto a alegria de nos
assemelharmos a Jesus Cristo ressuscitado tem de produzir em nós um regozijo
maior. A penitência quaresmal por isso deve ter sempre uma dimensão de prazer e
alegria. Nesse sentido é importante resgatar o verdadeiro sentido, dando um
sentido mais pascal a certas práticas e gestos que fazemos.
Seria muito
interessante que na Quaresma pudesse ser para as comunidades cristãs, algo
correspondente ao que, para as escolas de samba e blocos de carnaval, é o tempo
de treinamento e concentração necessário à grande festa do carnaval. Já desde o
fim do carnaval deste ano, se prepara o próximo desfile.
Um exercício
libertador seria abrir-nos mais à escuta da Palavra de Deus, confrontando-a com
nossa vida e participarmos mais ativa e efetivamente nas celebrações
litúrgicas. O essencial é que haja em nós uma verdadeira metanoia, ou seja, a conversão do coração e da mente, em
todos os aspectos da nossa vida cotidiana. A prática da penitência deve ser
encarada não só no sentido individual, mas na sua dimensão comunitária,
percebendo a dimensão social do pecado e suas conseqüências na vida da
comunidade e da sociedade.
A prática do jejum, no tempo da Quaresma, precisa ser
redescoberta. Trata-se não só de privar-se da questão de alimentos, mas também
de fazer uma contestação a tantas comodidades que a vida moderna nos oferece.
Seria reforçar o nosso autodomínio, cuidar da nossa saúde, não desperdiçar, não
entrar na onda do consumismo desenfreado e se abrir e partilhar com quem
precisa da nossa solidariedade. Podemos encarar o jejum no sentido de renúncia.
O saudoso Pe.
Geraldo Leite orientava sua comunidade para “jejuns” bem específicos:
* jejum da língua: evitar de
falar o que não se deve... fofocas, maledicências... (primeira
semana);
* jejum dos passos: evitar
freqüentar lugares inconvenientes a um bom cristão (segunda
semana);
* jejum da vista: por exemplo,
evitar novelas e certos programas de TV para participar
dos encontros durante a semana, via-sacra, caminhadas penitencias, ...
(terceira
semana);
* jejum do gosto: em comunhão com
os que passam fome, evitar aqueles alimentos que
mais apreciamos, como doces, sorvetes... (quarta semana);
* jejum do coração: buscar sempre
o desapego das coisas que nos atrapalham de entrar no
seguimento de Jesus Cristo... (quinta semana).
Durante a
Quaresma a oração também deveria
adquirir um novo sentido. Deveria não só ampliar a intensidade da oração
individual e comunitária, mas também rezar em espírito e verdade, isto é,
abrir-nos para o desejo de Deus em nós, para a gratuidade e o perdão, acolhendo
a ternura e o abraço carinhoso de Deus que quer fazer de nós novas criaturas.
Irmã Penha
Carpanedo e Pe. Marcelo Guimarães têm uma explicação excelente para a Quaresma:
“Celebrar a Quaresma é festejar o refazer da aliança de Deus com a gente e que
o nosso pecado e nossa negligência romperam. É renunciar aos nossos instintos
egoístas e abrir-nos mais ao plano do Deus da vida. Celebrar a Quaresma é
intensificar a oração, o jejum e a caridade, para vivermos mais consagrados ao
Deus que nos reconciliou com ele. Celebrar a Quaresma é deixar-se conduzir ao
deserto, para que o Senhor nos fale ao coração. É rever as linhas de conduta,
corrigir os erros de trajetória, aprofundar a unidade entre nós. É assumir e reconhecer o negativo, a morte, o
sofrimento, para vencê-los e superá-los. Como o grão de trigo que morre para
nascer. Como a mulher que está para dar à luz e sofre as dores de parto. Como a
uva que se esmaga para fazer o vinho que alegra a nosso coração.”
Podemos também
comparar com a vela que se acende. Para clarear ela derrama lágrimas para que
todos possam contemplar a beleza da claridade.
A espiritualidade quaresmal é
caracterizada também por uma atenção, profunda e prolongada da Palavra de Deus.
É esta Palavra que ilumina a vida e chama à conversão derramando em nós
confiança na misericórdia de Deus.
É preciso
urgentemente fazer da Quaresma um tempo favorável de avaliação de nossas opções
de vida e linhas de trabalho, para corrigir os erros e aprofundar a vivência da
fé cristã, abrindo-nos a Deus, ao próximo e realizando ações concretas de
fraternidade e solidariedade.
A Quaresma é
um tempo forte de conversão, de mudança interior, tempo de deixar tudo o que é
velho em nós, tempo de assumir tudo o que traz vida para todos nós, em nossas
famílias, em nossas comunidades e em nossa sociedade.
Quaresma é:
* Tempo de nos abrir para a
novidade que brota da Cruz de Cristo como sinal de nossa
salvação.
* Tempo de sermos novas criaturas
revivendo a atualizando nosso batismo e assim
Confirmamos nossa pertença à Igreja, povo de Deus.
* Tempo de buscar a libertação do
povo hoje tão sofrido e tão explorado e vítima de tanta
corrupção, desmandos e descasos.
* Tempo de abandonar os ídolos
modernos e de renovar nossa fidelidade ao Deus vivo e
verdadeiro através da escuta atenta da sua
Palavra.
* Tempo de subir ao monte Tabor
com Jesus Cristo, viver na intimidade com Ele e alegrar
com sua amizade e sua ternura.
* Tempo de descer para o chão da
vida, ver o rosto transfigurado de Jesus no deficiente
físico, no pobre, no doente, no injustiçado...
* Tempo de nos deixar tocar pelo
amor misericordioso do nosso Deus.
* Tempo de ressuscitar com Cristo
e nos colocar a serviço do seu Reino.
O Ano B de Marcos e o tema da Aliança.
Os temas do
ano B chamam a nossa atenção para a Páscoa de Cristo. Nos dois primeiros
domingos as leituras do Evangelho trazem o tema das tentações de Jesus e da
transfiguração na visão de Marcos. Mesmo lendo nos dois primeiros domingos da
Quaresma todos os anos os textos das tentações do deserto e da transfiguração
de Jesus, o Lecionário Dominical nos propõe três caminhos quaresmais: um
caminho batismal (ciclo A), um caminho cristocêntrico-pascal (ciclo B) e um
caminho penitencial (ciclo C).
A finalidade
deste ano do evangelista Marcos é ressaltar o tema da Aliança reconstruída. A maneira como o Pai
reconstrói a Aliança rompida pelo pecado do paraíso. Portanto, a Nova Aliança,
em Cristo, com o novo povo de Deus. No Espírito da Nova Aliança, as leituras
orientam a reflexão litúrgica da Quaresma.
É impossível
vivenciar toda a espiritualidade da Quaresma sem conhecer a liturgia deste
tempo. A liturgia da Quaresma está dividida em três ciclos, cada ano um ciclo. Daí chamamos de ANO A, B e C. O ano A segue o Evangelho de Mateus que
tem como característica o tema do Batismo
(A Samaritana junto ao poço no Terceiro Domingo João 4,5-42, O Cego de nascença
no Quarto Domingo João 9,1-41 e A Ressurreição de Lázaro no Quinto Domingo João
11 1-45. O Ano B segue o Evangelho de
Marcos ressaltando o tema da Aliança
e recai sobre a pessoa de Jesus (A Expulsão dos vendilhões do templo no Terceiro
Domingo João 2,13-25, O Encontro com Nicodemos no Quarto Domingo João 3,14-21 e
O Grão de trigo caído na terra no quinto domingo João 12,20-33. O Ano C apresenta o tema da Penitência e da Conversão bem evidenciados
(A parábola da “Figueira estéril” no Terceiro Domingo Lucas 13,1-9, A parábola do “Filho
pródigo” no Quarto Domingo Lucas 15, 1-3.11-32 e o episódio da “Mulher
pecadora” no Quinto Domingo João 8,1-11.
O bom uso do
Lecionário. O ciclo A é ligado com o Batismo. O ciclo B deste ano, com a
Aliança. Na época em que foi preparado o Lecionário Dominical, diversos peritos
julgavam que, para a Quaresma, seria suficiente só o ciclo A, porque seu
alcance doutrinal é fundamental. Mas prevaleceu o parecer dos biblistas. Afinal
chegou-se a uma decisão equilibrada. Nas comunidades onde há adultos que se
preparam para os sacramentos da iniciação cristã (Batismo, Eucaristia e Crisma)
na noite da Páscoa, deve-se utilizar o ciclo A, o qual, no entanto, quando se
julgar oportuno, pode ser usado sempre como indica o próprio Lecionário
Dominical, nas páginas 438, 442, 446, 752, 756 e 760. Mas, onde não houver
adultos preparando-se para os sacramentos, poderão ser usados, conforme os
anos, os ciclos B e C, porque a linha do ciclo A é fundamentalmente batismal.
A liturgia da
Palavra vai nos apresentando na primeira parte da Quaresma o tema da conversão ou penitência, e na segunda
parte a renovação batismal, para
chegarmos à noite da Páscoa convertidos e renovados na opção do nosso Batismo.
É apaixonante a tarefa que hoje propomos no caminho para a Páscoa.
O povo que
havia desviado do projeto do Pai retorna a Ele. A conversão é deixar o passado
e assumir, para o futuro, o projeto de amor. Converter-se significa “mudar de
rumo”, ir em direção ao Senhor, que se faz presente em cada irmão e irmã que
sofre.
Os dois
primeiros domingos estão construídos como os anos A e C, isto é, Mateus e Lucas:
tentação e vitória de Cristo (primeiro domingo); transfiguração (segundo
domingo). Os evangelhos são tirados de Marcos.
Pe. Benedito Mazeti
Assessor diocesano de Liturgia
Bispado de São José do Rio Preto
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