28 de fevereiro de 2016
Leituras
Êxodo 3,1-8a.13-15
Salmo 102/103,1-4.6-8.11
1Coríntios 10,1-6.10.12
Lucas 13,13-9
“SE NÃO VOS CONVERTERDES, IREIS MORRER
DO MESMO MODO”
1- PONTO DE PARTIDA
Domingo da
conversão do coração. Neste terceiro Domingo de nossa caminhada quaresmal,
transfigurados descemos do Monte Tabor para o chão sofrido da vida cotidiana,
realizando nosso êxodo pela conversão
sincera e pelo incansável trabalho para que o Reino de Deus se manifeste em
nossa terra. Reconheçamos a santidade do nosso Deus. Ele nos reúne de todas as
nações e derrama sobre nós um espírito novo, conforme a sua promessa.
Mais do que
nunca nossa conversão é uma necessidade imperiosa e urgente. A liturgia de hoje
nos alerta e anima para esse passo decisivo rumo à Páscoa. Hoje a liturgia nos
coloca diante do Deus misericordioso e paciente que, nesta Quaresma, novamente
nos “dá um tempo” para nos convertermos ao Reino que Jesus veio inaugurar.
2- REFLEXÃO BÍBLICA, EXEGÉTICA E LITÚRGICA
Contemplando os textos bíblicos
Primeira leitura – Êxodo 3,1-8a.13-15.
O A primeira leitura relata o início da libertação do Egito. O povo hebreu
vivia maltratado, perseguido, escravo no Egito, trabalhando na construção civil
e na lavoura para enriquecer o país, e era muito maltratado e perseguido.
Enquanto tomava conta do rebanho do sogro Jetro, Moisés ouviu, de dentro de uma
sarça ardente, o chamado de Deus para libertar seu povo da escravidão do Egito,
e, neste dia recebeu a revelação do nome de Deus e o chamado para servi-lo.
O fogo é uma
teofania, que traduz a experiência da presença de Deus. Para as tribos nômades,
o lugar de culto era sagrado e não podia ser tocado com “pés calçados”,
conforme costumes trazidos do Egito. O local em que estava a sarça ardente
deveria ser sagrado. Moisés, portanto, não podia se aproximar muito. É Deus
quem se aproxima de seus escolhidos. Identifica-se com o Deus dos patriarcas,
Deus que “vê, ouve, conhece” a situação sofrida de seu povo no Egito.
O clamor
humano é a tomada de consciência da situação opressora. Expressa desejo, fé e
esperança da libertação. Esse clamor liga-se à iniciativa de Deus de salvar seu
povo em dois tempos: primeiro, libertar da escravidão e depois tirar da terra
opressora e levar para uma terra fértil, “onde corre leite e mel”.
Deus é
profundamente sensível aos sofrimentos do povo e toma a iniciativa de agir para
libertá-lo. Deus atua por meio de Moisés, que deixa de ser pastor de ovelhas e
passa a conduzir o povo através do deserto, à liberdade da terra prometida para
se constituir como povo fiel ao Senhor.
No versículo 1
fala da montanha de Deus, Horeb. Todos os especialistas da Bíblia concordam em
afirmar que o Horeb é o mesmo Sinai. Talvez Horeb seja mesmo o nome mais
antigo. A palavra Horeb vem de uma raiz que significa região seca, desolada. A
Palavra Sinai, tem sua origem pela proximidade do deserto de Sin.
Deus
manifesta-se na forma de misteriosa de fogo que não consome a sarça. É bastante
freqüente, no Primeiro Testamento, o fogo servir de manifestação de Deus. (cf.
Gênesis 15,17; Êxodo 19,18; Deuteronômio 4,12; 2Reis 2,11; Isaias 6,6s; Daniel
7,10). No entanto o fogo é apenas um
sinal.
No diálogo,
Deus começa a se apresentar. Não é alguém que vem para aterrorizar, nem é uma
nova divindade. É o Deus dos ancestrais do povo de Moisés, é o Deus da
promessa. É o Deus da história. Deus não é alheio à história das pessoas, e
especialmente não fica indiferente diante do sofrimento e da opressão. Ele toma
a defesa dos fracos, dos que são escravizados e perseguidos. Mas Deus não faz isto diretamente. Ele
busca intermediários, chama e envia pessoas que, em seu nome, tomam a si a
tarefa de defender os fracos e libertar os oprimidos. E para isto garante a
essas pessoas que Ele envia a sua presença.
Uma
questão importante é o verbo como aparece no texto: “ele é”, “aquele que é”.
Seria a enfatização da qualidade daquele que existe realmente, daquele que
existe sempre. Em contraposição aos ídolos que nada são. Daí a forma verbal
Javé. Então o sentido seria: “ele faz ser”. Deus é aquele que faz as coisas
existirem Neste caso, o sentido do nome de Javé não seria uma definição de si
mesmo como aquele que existe, mas como o Criador. Javé é verbo e não substantivo masculino. No antigo oriente
conhecer o nome de alguém equivalia a ter poder sobre ele, Deus ao dizer “eu
sou aquele que sou” não estaria dando o próprio nome, mas estaria dando como
uma desculpa. As fórmulas “eu sou”, “ele é” indicariam a impossibilidade de
definir Deus, de conhecer seu verdadeiro nome, e, em conseqüência a
impossibilidade de ter qualquer domínio sobre Deus. Em outras palavras, seria a
enfatização da transcendência divina. O importante é que Deus entra em diálogo
com a pessoa humana, envia-o a auxiliar o irmão mais necessitado, toma a defesa
do sofredor e do oprimido, e, nesta tarefa, garante a assistência de sua
presença: “eu estarei contigo” (versículo 2). “Eu sou” significa presença
permanente na história do povo!
Salmo responsorial 102/103,1-4.6-7.8.11.
é um hino de louvor. Louva-se a Deus com todas as forças e por todos os
benefícios concedidos a uma pessoa (versículos 1b-2) e a todo o povo
(versículos 7-19).
O rosto de
Deus neste salmo. As sete ações de Deus no primeiro momento (versículos 3-6),
com seu eixo central (“amor e compaixão”), fornecem um retrato grandioso de
Deus: perdoa, cura, redime da cova, coroa a vida de amor e compaixão, sacia,
faz justiça e defende todos os oprimidos. É mais uma vez o aliado fiel.
É um Deus que
faz história com seu povo (versículo 7), perdoando e sendo compassivo. O rosto
do Pai é interessante. Compaixão é a mais preciosa qualidade de um pai. É
também a maior característica de Deus. É o aliado compassivo que caminha com
seu povo perdoando, pois foi Ele quem nos criou.
De Jesus se
diz que “amou até o fim”, ou seja, até as últimas conseqüências (João 13,1). A
compaixão é a Sua característica principal diante do sofrimento ou clamor das
pessoas (Mateus 9,36; 14,14; 15,32; 20,34; Marcos 6,34; 8,2; Lucas 7,13). Jesus
também perdoou pecados, curou doentes, ressuscitou mortos, saciou famintos, fez
justiça e defendeu todos os oprimidos. Ensinou-nos a chamar Deus de Abbá,
Paizinho. As parábolas da misericórdia (Lucas 15) ilustram bem quem é o Deus de
Jesus Cristo e Pai de toda a humanidade.
Cantemos ao
Senhor, porque é um Deus que sempre ouve o clamor dos fracos e sofredores.
O SENHOR É
INDULGENTE, É FAVORÁVEL
É PACIENTE, É
BONDOSO E COMPASSIVO.
Segunda leitura – 1Coríntios 10,1-6.10-12.
Paulo faz um resumo dos principais acontecimentos do Êxodo à luz de Jesus
Cristo, mostrando a importância destes fatos para a comunidade cristã que vive
na etapa final da história que começou no Êxodo. Também para nós estes fatos
são importantes.
Se Cristo não
veio destruir a Lei, então não podemos renunciar à experiência do Primeiro
Testamento (AT). Será fácil considerar tudo letra morta, difícil é distinguir o
que permanece válido. Paulo, então, projeta sobre fatos do passado a
perspectiva cristã.
Desse modo a
passagem do mar, o maná, a água da rocha, a nuvem são prefigurações do que
definitivamente aconteceria aos cristãos. A passagem do mar Vermelho assume o
significado de um batismo realizado pela mediação de Moisés, que é a figura do
Salvador (cf. Romanos 6,3-11; Gálatas 3,27s; João 1,17), Cristo, que levaria,
qual novo Moisés, o povo a passar o mar da morte. Como Moisés levou o povo à
salvação pela água, atravessando o mar, Cristo pelo batismo salva o povo. A
união que havia entre Moisés e o povo acontece agora entre Cristo e o novo povo
a pelo batismo.
1Coríntios
considera o maná e a água muito mais que um puro alimento natural, os qualifica
de espiritual, não só quanto à origem, mas de modo que poderíamos falar de uma
sacramentalidade presente naqueles dons do deserto, enquanto eles contribuíam
para a salvação dos israelitas, como
hoje para os cristãos contribuem os sacramentos.
O Primeiro
Testamento não é só história para atender a nossa curiosidade, ele tem valor
imediato no agora, tem valor para os cristãos, e a experiência histórica por
ser relatada é atual. O próprio Paulo, em sua simplicidade de pastor, inclui-se
a si mesmo entre aqueles que podem não resistir à tentação de orgulho e cobiça.
Os fatos, então são figuras do mistério cristão e exemplos do que não deve ser
feito (versículos 6-11).
Evangelho – Lucas 13,1-9. Hoje o
Evangelho traz um relato feito somente por Lucas, em 13,1-5: a matança de
galileus comandada por Pilatos (que governou entre os anos de 26 a 36) durante a Páscoa e a
morte de dezoito trabalhadores na torre de Siloé. A história narra várias
intervenções sangrentas de Pilatos em Jerusalém. Jesus
está a par das notícias. O que acontece por trás é um fato social – a
insurreição de um grupo de galileus – e uma catástrofe natural – a queda da
torre de Siloé. Esses acontecimentos eram
considerados castigo de Deus infligido a pecadores. Mas os verdadeiros
culpados, os chefes do sistema opressor, não recebiam castigos nem tinham
prejuízo.
Jesus não
aceita a interpretação simplista da culpa de quem morreu. É preciso saber ler o
que está por trás das ocorrências. Jesus chama ao discernimento social,
histórico e econômico dos fatos atuais e convida à conversão. Todos têm responsabilidade pelo que acontece.
A segunda
parte do texto é a parábola da figueira estéril. O dono da vinha procurou por
frutos durante três anos e nada encontrou. Conclusão: a figueira estava
esgotando a terra. Para que ocupar o lugar inutilmente? O vinhateiro sugere
esperar mais um ano e propõe-se a cuidar de forma especial da figueira. O
trabalhador que zela pela figueira é a figura do próprio Jesus, que pede pelo
seu povo e protege-o. Ele é o Redentor, que luta pela vida, empenha-se na
libertação de seu povo e resgata-o de suas misérias e escravidões.
Lucas é o
único dos Evangelhos Sinóticos (Mateus, Marcos e Lucas) que usa o verbo katargein (tornar um terreno estéril;
esgotar o chão; sugar as forças e reservas vitais dele para não produzir).
Lucas transforma o episódio numa parábola da paciência de e numa chamada à
conversão.
Na parábola, é
dado um novo prazo, uma nova chance para a figueira. Não é um tempo longo ou
indefinido. Jesus não diz se o dono da vinha aceitou a proposta ou não. Em Jr
29,17 lemos uma profecia contra aqueles que não produzem frutos: “Eis que lhes
vou enviar a espada, a fome e a peste; e os farei semelhantes a figos podres
que não podem ser comidos, de tão ruim que são”.
3. DA PALAVRA CELEBRADA AO COTIDIANO DA VIDA
Hoje, a
Palavra de Deus nos alerta sobre os sinais dos tempos, vindos de catástrofes da
natureza e acontecimentos sociais, políticos e econômicos. A palavra de ordem
de nosso Senhor é necessidade da conversão.
Os dezoito
trabalhadores na torre de Siloé tiveram uma morte trágica. O povo logo
interpretou que morreram por castigo de Deus. Jesus questiona esse
entendimento: a culpa era do pecado do pobre trabalhador ou faltou que os
patrões dessem condições mínimas de segurança para o trabalho? É castigo de
Deus ou desrespeito à vida e ganância do patrão?
Outro
acontecimento foi um dos massacres que Pilatos empreendeu em Jerusalém. O domínio
estrangeiro estragou toda a vida do povo, tirando-lhe os direitos fundamentais.
Jesus alerta-nos quanto à ingenuidade de aceitar as interpretações dos grandes,
que, em geral, culpam o povo, especialmente os mais pobres. É preciso ter em
mente que as catástrofes não são castigos, mas lembretes! E não adianta
pertencer ao grupo dos “eleitos” – os judeus no deserto, os fariseus do tempo
de Jesus, ou os “bons cristãos” hoje. O negócio é converte-se! Pois cada um
descobre algo a endireitar, quando se coloca diante da face de Deus. Ou melhor,
em tudo o que fazemos e somos, mesmo em nossas ações e atitudes mais dignas de
louvor, descobrimos os traços de nosso egoísmo e falta de amor, quando nos
expomos à luz da “sarça ardente”. Só Deus é Santo. Por isso, todos nós devemos
converter-nos, sempre.
Deus age a
favor de seu povo oprimido e excluído, através de pessoas sensíveis, solidárias
e comprometidas. Gente que ouve o clamor dos empobrecidos e, muitas vezes,
abandona seus privilégios, “troca de sandálias” e põe-se na caminhada com os
preferidos de Deus. Toda a história da salvação que Deus viveu com seu povo
aponta o Messias e sua proposta de nova aliança, e exige de nós uma resposta de
fé e bons frutos, concretizada na caridade fraterna.
Na liturgia de
hoje, aprendemos que cabe à comunidade cristã viver o projeto de Deus, com uma
vida cheia de frutos do Reino. Então, nesse tempo quaresmal, somos convidados a
ampliar o horizonte de esperança dos pobres e oprimidos. Isso se torna possível
quando manifestamos a solidariedade de Deus na nossa solidariedade, não
permitindo que a “árvore” de nossa vida se torne estéril, uma vez que ela é
sempre adubada pela bondade divina.
Deus quer
ouvir hoje o clamor do povo com nossos ouvidos, a atender mediante o nosso
compromisso cristão. Então, no nosso cotidiano, é preciso descobrir quais são
os frutos que Deus, pacientemente, espera de nós. Em nosso tempo, tragédias
também acontecem, sejam naturais, como
os terremotos p. ex., sejam as de ordem acidental, como os tantos desastres,
nas suas diversas formas. O importante não é saber “porque” acontecem, mas o
que Deus espera de nós quando tais tragédias acontecem. É certo pensar que Deus
quer nos ver solidários com as vítimas de tais acontecimentos, longe de
pré-julgamentos, lembrando-nos de que Ele é sempre o Deus da vida.
Nota-se que
hoje nos preocupamos com o vazio de nossas igrejas e a conseqüente busca de
outras, principalmente das seitas. Antes e nos preocuparmos com o “porque” de
tal fato, deveríamos verificar se nossas comunidades estão dando os frutos de
que o povo precisa ou se estão tornando árvores infrutíferas. De tudo que foi
objeto de nossa reflexão e tentando uma síntese da liturgia de hoje, podemos
perguntar:
- Nesse tempo
quaresmal, o que nossa comunidade poderá fazer no que concerne à causa dos
pobres e oprimidos?
- Quais são os
frutos que Deus espera, pacientemente, colher de nossa vida?
Quaresma é
tempo de conversão, de retorno ao projeto de Deus. Temos consciência de que
somos a figueira para a qual Jesus pede tempo, que somos pecadores e temos de converter,
“tirar as sandálias” dos pés, vencer a ingenuidade e saber ler os sinais dos
tempos?
Nisto consiste
a boa nova deste Evangelho de hoje. Deus, em Jesus, sempre nos dá uma última
chance. A Quaresma é o tempo da paciência de Deus, é o tempo de que Ele nos dá
para que possamos produzir frutos de justiça e amor verdadeiro. Que Ele nos
tire do comodismo e coloque em nós o fervor do seu Espírito.
4- A PALAVRA DE FAZ CELEBRAÇÃO
Para
celebrarmos dignamente os santos mistérios, a liturgia coloca nos ritos
iniciais da celebração eucarística o Ato penitencial. Nesse rito, nós nos
colocamos diante de Deus, não enumerando pecados, pois não se trata de
confissão sacramental, mas confessando a misericórdia divina, que é infinita.
Por si mesmo, o rito revela a nossa condição de pecadores.
Por muito
expressivas que sejam as monições e textos sugeridos para o Ato Penitencial,
deve-se valorizar sempre o rito do “Asperges” por causa de sua relação com o
nosso Batismo. Mesmo sem eficácia sacramental, a objetividade litúrgica do Ato
Penitencial é despertar em nós o sentido e o desejo de conversão, como ensina
Jesus no evangelho de hoje.
Vida Cristã, sempre um novo êxodo
Celebramos a
Eucaristia, sempre celebramos um novo êxodo, pois passamos da morte para a
vida. E a vida cristã, que deve ser vida de comunhão, na prática do amor e da
justiça, deve buscar sua força na Eucaristia, que é o seu viático, “o remédio
ou o elixir da imortalidade”, nas palavras de Santo Inácio de Antioquia.
Na Quaresma
nos é dado celebrar um tempo de graça e de salvação, para renovar nosso coração
na santidade, excluindo dele todo apego e paixões desordenadas. E se Deus se
revela, na sua santidade num fogo devorador, é porque exige de nós pureza de
coração e mudança de vida. É preciso, portanto, deixar-nos queimar no fogo
purificador de Deus.
Tornar-nos um só corpo no amor
A Eucaristia
alimenta em nós o desejo de nos colocar à luz da “sarça ardente”, não com os
impulsos da curiosidade humana, mas sedentos do “fogo abrasador” de Deus, que
não se extingue, para queimar em nós todo o egoísmo, abrindo-nos para a vida
verdadeiramente fraterna. Assim, toda a ritualidade litúrgica da Eucaristia se
converte para esse fim, tornando-nos um só corpo com Cristo, um só coração e um
só espírito, como pedimos na Oração Eucarística (invocação [em grego =
epiclese] sobre os comungantes).
5- LIGANDO A PALAVRA COM A AÇÃO EUCARÍSTICA
Como pobres e
pecadores, prostramo-nos diante da face de Deus e ouvimos seu insistente apelo
de conversão e vida nova.
Nossa fé cristã
afirma que a Igreja, o povo de Deus convocado, faz a Eucaristia e que a
Eucaristia faz a Igreja. Cada vez que celebramos a Eucaristia está se
reconstituindo, se reconstruindo. Volta e encontrar seu centro, que é dar a
vida. Dispõe-se a se entregar para os outros e, assim, se reconstitui como povo
que tem uma missão no meio dos pobres. É a decisão renovada de dar a vida nas
lutas humanas e nos projetos humanos que transforma este mundo. É povo que se
transforma em presença real de Cristo que se entregou por amor. É a
conseqüência do “Amém” proclamado ao comungar.
Na ação
eucarística, humildes e agradecidos reconhecemos os inúmeros benefícios que seu
amor paciente nos dá a cada dia. Oferecemos ao Pai nossa vida, acolhendo a
chance que ele, amorosamente, mais uma vez nos dá de produzirmos frutos de paz,
justiça e fraternidade, em comunhão com Cristo, sobretudo em relação à vida econômica
de nosso país.
Saciados pela
Palavra e pelo pão, suplicamos o auxílio de Deus para permanecermos fiéis ao
seu projeto de salvação e vida plena, com atenção especial ao resgate da
Amazônia como realização da Páscoa entre nós.
6. ORIENTAÇÕES GERAIS
1. Quando
lemos e interpretamos as Sagradas Escrituras na Missa é o próprio Cristo que
fala (cf. SC,7). A força sacramental da Palavra na liturgia faz acontecer
aquilo que anuncia; realiza nossa transformação pascal. Na liturgia da Palavra,
Cristo está realmente presente e atuante no Espírito Santo.
2. À
preparação espiritual se alia a preparação corporal: postura do corpo, tom de
voz, semblante, a maneira de aproximar-se da mesa da Palavra, as vestes dos
ministros...
3. Nem pelo
tom de voz nem de qualquer outra maneira se isole a narrativa da última ceia do
resto da oração eucarística, como se fosse uma peça à parte. Não se deter na
elevação do pão e do cálice, pois o centro da Oração Eucarística não é a
presença real de Cristo na Eucaristia, mas a ação de graças dirigida em
adoração ao Pai.
4. Um erro
grave nas celebrações da eucaristia é a distribuição da comunhão do sacrário
como prática normal. Assim pecamos contra toda a dinâmica da ceia eucarística,
que consta da preparação das oferendas, da ação de graças, sobre os dons
trazidos, da fração Fo pão consagrado e da distribuição àqueles que, com a
oblação deste pão, se oferecem a si mesmos com Jesus ao Pai (cf. IGMR 56 h).
5. Na época em
que foi preparado o Lecionário Dominical, diversos peritos julgavam que, para a
Quaresma, seria suficiente só o ciclo A, porque seu alcance doutrinal é
fundamental. Mas prevaleceu o parecer dos biblistas. Afinal chegou-se a uma
decisão equilibrada. Nas comunidades onde há adultos que se preparam para os
sacramentos da iniciação cristã (Batismo, Eucaristia e Crisma) na noite da
Páscoa, deve-se utilizar o Ciclo A, o qual, no entanto, quando se julgar
oportuno, pode ser usado sempre como indica o próprio Lecionário Dominical, nas
páginas 438, 442, 446, 752, 756 e 760. Mas, onde não houver adultos
preparando-se para os sacramentos,
poderão ser usadas, as leituras do Ciclo C.
7. MÚSICA RITUAL
O canto é
parte necessária e integrante da liturgia. Não é algo que vem de fora para
animar ou enfeitar a liturgia. Por isso devemos cantar a liturgia e não cantar na liturgia. Os cantos e músicas,
executados com atitude espiritual e, condizentes com cada domingo da Quaresma, ajudam a comunidade a penetrar no
mistério celebrado. Portanto, não basta só saber que os cantos são da Quaresma,
é preciso executá-los com atitude
espiritual. A escolha dos cantos deve ser cuidadosa, para que a comunidade
tenha o direito de cantar o mistério celebrado. Jamais os cantos devem ser escolhidos para satisfazer o
ego de um grupo ou de um movimento ou de uma pastoral. Não devemos esquecer que
toda liturgia é uma celebração da Igreja corpo de Cristo e não de um grupo, de
uma pastoral ou de um movimento.
Ensina a
Instrução Geral do Missal Romano que o canto de abertura tem por objetivo, além
de unir a assembléia, inseri-la no mistério celebrado (IGMR nº 47). Nesse
sentido o Hinário Litúrgico II da CNBB e o Ofício Divino das Comunidades nos
oferecem uma ótima opção, que estão gravados nos CDs Liturgia XIII, XIV e CD:
CF 2013.
1. Canto de abertura. “Tenho os
olhos sempre fixos no Senhor”, (Salmo 24/25,15-16 / Ezequiel 36,23-26)
Conversão, purificação e reunião escatológica do povo. Sem dúvida, um canto de
abertura condizente com o mistério celebrado e poderá cooperar para que a
assembléia seja nele inserido é na procissão de entrada neste 3º Domingo,
entoar um canto que expresse nossa caminhada de conversão. O canto mais
indicado é: “Senhor, eis aqui o teu povo”, CD: Liturgia XIII, melodia da faixa
1, Quaresma Ano A. Outra opção é o canto “Ah, se o povo de Deus no Senhor
cresse”, CD: Liturgia XIV, melodia da faixa 14.
2. Canto durante a aspersão.
“Piedade, ó Senhor, tende piedade”, CD: Liturgia XIII, melodia da faixa 2;
“Lavai-me, Senhor, lavai-me”, CD: CF 2004, melodia da faixa 5.
3- Salmo responsorial 102/103. A
justiça de Deus é força e misericórdia. “O Senhor é indulgente, é favorável, é
paciente, é bondoso e compassivo”, CD: Liturgia XIV, melodia da faixa 15.
4- Aclamação ao Evangelho. Convertei-vos:
o Reino de Deus está próximo (Mateus 4,17). “Honra, glória, poder e louvor, a
Jesus nosso Deus e Senhor... Eis o Reino a chegar, povo meu, convertei-vos!” CD:
Liturgia XIV, melodia da faixa 12.
Na Idade
Média, era costume o povo responder ao sermão (hoje homilia) com o canto de
“Kyrie Eleison!”. Houve, no passado, pregadores famosos, que deixavam o povo
cantar cânticos no início ou no fim do seu sermão. Se for possível, pode entoar
o Hino da Campanha da Fraternidade desse ano.
5. Apresentação dos dons: O
canto de apresentação das oferendas, conforme orientamos em outras ocasiões,
não necessita versar sobre pão e vinho. Seu tema é o mistério que se celebra
acontecendo na fraternidade da Igreja reunida em oração na Quaresma. O canto
mais apropriado para hoje é o canto: “Eis o tempo de conversão”, CD: Liturgia
XIV, melodia da faixa 6, Quaresma Anos B e C. Outra opção é o canto: “Todo o povo sofredor o seu pranto
esquecerá”, CD: Liturgia XIV, melodia da faixa 13.
6. Canto de comunhão: Até o
pássaro encontra abrigo junto ao altar de Deus (Salmo 83/84). Contemplando o
apelo de Deus à conversão e a sua misericórdia, eis o canto mais apropriado
para hoje, cantemos: “Agora o tempo se cumpriu, o Reino já chegou”, CD:
Liturgia XIV, melodia da faixa 3 ou Hinário Litúrgico II da CNBB, página 17. A
Igreja também oferece outros dois cantos: Isaias 58: “Como o raiar, raiar do
dia a tua luz surgirá...” CD: Liturgia XIV, melodia da faixa 7 ou Hinário Litúrgico
II da CNBB, página 117; “Ó Pai, teu povo busca vida nova”, CD: CF 2013, melodia
da faixa 7.
O canto de
comunhão deve retomar o Evangelho. No 3º .Domingo da Quaresma, mergulhamos numa
atitude de profunda conversão. Devido
o espírito de confiança que anima a liturgia de hoje e certos, da misericórdia
dele, podemos cantar na comunhão o Marcos 1,15. “Agora o tempo se cumpriu, o
Reino já chegou”, como indicamos acima. Está articulado com o Salmo 1. Vamos
também com Ele pregar o Evangelho de Deus para que todos se convertam.
8- O ESPAÇO DA CELEBRAÇÃO
1. Se há um
elemento, que, sem palavras, cumpre a função mistagógica, isto é, de conduzir
para dentro do mistério celebrado, este é o Espaço Sagrado. Por isso, devemos
dedicar-lhe todo o nosso cuidado.
2. A cruz
processional poderá ser “fincada” após a procissão de entrada num vaso onde
está uma planta que tenha a aparência de árvore, de modo eu se dê a entender
que a cruz é a “árvore da vida”, aquela que dá frutos, bem de acordo com o
Evangelho.
3. A cruz é
uma peça importante nas celebrações do Mistério Pascal do Senhor. Ela é
entendida pela Instrução Geral do Missal Romano como um elemento que deve
recordar aos fiéis o acontecimento da fé ali celebrado.
4. Todos nós
sabemos que o Tempo da Quaresma exige sobriedade quanto à ornamentação do
espaço da celebração. Ele deve manifestar nossa fragilidade diante do mistério,
nossa nudez diante da graça de Deus que nos acompanha e nos solicita total
perseverança evangélica. A ausência de flores, com exceção do quarto domingo
(Domingo Laetare), quer causar a sensação de sobriedade, sem aparência festiva.
Já é de praxe, o uso da cor roxa nas vestes, velas e paramentos. Mas temos que
ir além. Redescobrir, a cada vez, o sentido da chamada “reserva simbólica”:
Durante este tempo (a quaresma) é proibido ornar o altar com flores, cantar o
aleluia ou o hino de louvor, o canto de louvor a Deus após a comunhão, com
exceção das solenidades e festas.
5. Neste
contexto, a equipe procure caracterizar o ambiente e organizar toda a
celebração dentro de uma certa sobriedade (cor roxa, sem flores, sem glória,
sem aleluia e sem o canto de louvor a Deus após a comunhão, isto é, despojado e
austero. Isso não quer dizer que o ambiente seja de tristeza. A fé cristã une
numa mesma celebração a dor e a alegria,
a luta e a festa. Na Quaresma se
retoma o silêncio, as celebrações são mais silenciosas, sóbrias, simples,
austera. Não se enfeita o espaço celebrativo com flores. Os instrumentos apenas
acompanham o canto. Não deve ter baterias e instrumentos de percussão fazendo
aquele barulho como se fosse uma boate. É o silêncio que predomina.
9. AÇÃO RITUAL
A regra da
reserva simbólica vale para todos. A liturgia nos ensina a reservar os
elementos festivos para a festa da Páscoa. Assim, os grupos são chamados a
serem mais moderados na execução dos instrumentos, evitando “solos
instrumentais”, deixando de tocar algum instrumento, ou mesmo cantando algo “à
capela” (sem acompanhamentos musicais). É tempo também de escutar, de ser
“obediente”, de aguçar o discipulado: uma boa forma de manifestar isso seria
assumir o repertório da CNBB para as celebrações.
Ritos Iniciais
1. Acompanhando
a procissão de entrada na igreja, pode-se cantar “Senhor, eis aqui o teu povo”
(Hinário Litúrgico II da CNBB, página 296). Levar junto o cartaz da Campanha da
Fraternidade. Não esquecer que, à frente da procissão, vai a cruz processional.
Seria muito
oportuno a saudação inicial de 2Tessalonicensses 3,5:
“O Senhor, que encaminha os nossos corações
para o amor de Deus e a constância de Cristo, esteja convosco”.
2. Em seguida
quem preside, ou o diácono ou um leigo ou leiga preparado, dar o sentido da
celebração com estas palavras ou outras semelhantes:
Domingo da conversão do coração. A Quaresma
é o tempo da paciência de Deus, é o tempo que Ele nos dá para que possamos
produzir os frutos da justiça e da fraternidade. Reconheçamos a santidade do
nosso Deus. Ele nos reúne de todas as
nações e derrama sobre nós um Espírito novo, conforme a sua promessa.
3. Em seguida
fazer uma recordação da vida tornando presentes as realidades que hoje precisam
ser transfiguradas, transformadas. Trazer os fatos da vida de maneira orante e
não como noticiário.
4. Neste
Domingo é muito oportuno substituir o Ato penitencial pelo Rito do “Asperges”,
condensando na oração de bênção da água a dimensão da compreensão da
purificação dos pecados. A seguir uma fórmula de bênção que pode ser usada:
Ó Deus
misericordioso e compassivo,
Reunidos em
vossa casa, Terra Santa,
Neste tempo
oportuno para a confissão
De nossa
fragilidade e da conversão do coração,
Vos
suplicamos: abençoai esta água que sobre
Nós será
aspergida, para que, conscientes
De nossas
culpas e responsabilidades diante
Do Evangelho
de vosso Filho,
Sejamos
purificados e nos tornemos aptos
A participar
de vossa Páscoa.
Por Cristo,
Senhor Nosso. Amém.
5. Se optar
pelo Ato penitencial, rezar a fórmula 2 do Missal romano, página 392.
Tende compaixão de nós, Senhor...
6. Na Oração
do dia contemplamos Deus autor de toda bondade e suplicamos que Ele nos reerga
do peso de nossa consciência.
Rito da Palavra
1. Após a
leitura não é preciso mostrar o livro. Por que? Porque quando o(a) leitor(a)
diz “Palavra do Senhor” (para as leituras) ou “Palavra da Salvação” (para o
Evangelho), refere-se à Palavra do Senhor que acabou de ser proclamada e ouvida
pela assembléia e não ao livro em si.
2. Primeiro
escrutínio. Onde houver batismo na noite pascal, o ritual do catecumenato prevê
uma imposição de mãos sobre aqueles que receberão os sacramentos de iniciação
cristã. Depois da homilia, os escolhidos para o batismo, junto com padrinhos e
madrinhas, colocam-se diante da comunidade e quem preside reza e impõe as mãos
sobre eles. Página 70 do RICA (Ritual da Iniciação Cristã de Adultos).
Rito da Eucaristia
1. Na Oração
sobre as oferendas suplicamos a Deus que nos dê a maturidade de pedir perdão
dos nossos pecados e também saber perdoar os nossos irmãos.
2. É tempo de
usar os Prefácios do Tempo da Quaresma, que são muito bonitos e trazem uma boa
síntese teológica desse tempo litúrgico. Neste Terceiro Domingo da Quaresma é
muito oportuno o Prefácio I da Quaresma, página 414 do Missal Romano que
destaca a preparação da Quaresma pela penitência. Seguindo essa lógica, cujo
embolismo reza: “Vós concedeis aos cristãos esperar com alegria, cada ano, a
festa da Páscoa. De coração purificado, entregues à oração e à prática do amor
fraterno, preparamo-nos para celebrar os mistérios pascais, que nos deram vida
nova e nos tornaram filhas e filhos vossos”. O grifo no texto identifica
aqueles elementos em maior consonância com o Mistério celebrado neste Domingo e
que pode ser aproveitado na celebração, ao modo de mistagogia. Usando este
prefácio, o presidente deve escolher a I, II ou a III Oração Eucarística. A II
admite troca de prefácio. As demais não admitem um prefácio diferente. As
demais não podem ter os prefácios substituídos sem grave prejuízo para a
unidade teológica e literária da eucologia.
3. Neste
Domingo a Palavra ressalta a paciência e a misericórdia de Deus. Outra opção é
a Oração Eucarística sobre a Reconciliação I, que destaca a grande misericórdia
de Deus.
4. A narrativa
da instituição da eucaristia não é uma imitação da última ceia; por isso não se
parte o pão neste momento como algumas vezes acontece. A liturgia eucarística,
como se disse, é fazer o que Jesus fez: tomou o pão e o vinho, deus graças,
partiu o pão e o deu (comer e beber). O partir o pão, como Jesus fez,
corresponde à fração do pão em vista da comunhão. Por isso, a Redemptionis Sacramentum,
número 55, considera um abuso partir o pão durante o relato da instituição.
5. O “amém”
final do por Cristo, em Cristo..., que merece a mesma exultação, é a assinatura
do povo à prece que o ministro ordenado, em nome da Igreja, elevou a Deus por
Cristo, com Cristo, em Cristo, na unidade do Espírito Santo. Pelo menos aos
domingos e dias de festa merece ser cantado.
6. A fração do
Pão antes da comunhão deve ser feita de modo que todos possam acompanhar este
gesto, tão significativo. Não precisa ter pressa. Aguarde-se que o povo conclua
o abraço da paz (se houver) para iniciar a fração do pão com calma. Inicia-se o
hino do “Cordeiro de Deus” só quando começa a fração do pão. Este hino é muito
antigo, feito exatamente para acompanhar esta ação ritual. Seu sentido é este:
vendo o Cordeiro sendo partido e repartido, a assembléia prorrompe no canto:
“Cordeiro de Deus...!
7. Não
esquecer de, após a comunhão, reservar um tempo para a assembléia fazer um
profundo silêncio contemplativo do
encontro havido com Deus. Seria bom que até se fizesse uma breve motivação para
esse momento de silêncio orante, previsto pelo Missal Romano, nº 121, página
57.
Ritos Finais
1. Na Oração
depois da comunhão saciados na terra com o pão do céu, suplicamos a Deus que a
Eucaristia que recebemos manifeste em nossa vida o fruto do sacramento.
2. As palavras
do envio podem estar em consonância com o mistério celebrado: “Convertei-vos porque
o Reino de Deus está próximo”. Ide em paz e que o Senhor vos acompanhe.
10- CONSIDERAÇÕES FINAIS
A
liturgia deste Terceiro Domingo da Quaresma, enfatiza o tema da conversão. Tema
muito cara a Lucas, que nos propõe a rever a nossa vida não com
pré-julgamentos de irmãos, mas nos vendo
na condição de pecadores, sempre necessitados de conversão.
O objetivo da
Igreja e da nossa equipe diocesana de liturgia é ajudar os padres e as
comunidades de nossa diocese e todas aquelas outras comunidades fora de nossa
diocese que acessar nosso site celebrar melhor o mistério pascal de Cristo.
Um abraço fraterno
a todos
Pe. Benedito
Mazeti
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